No texto publicado semana passada, “Reflexões sobre o Underground”, eu tentei apresentar uma panorâmica do underground. Tracei alguns paralelos sobre os anos 80 e 90 e a época contemporânea e elenquei pontos positivos e negativos.
Em poucas palavras, o que eu quis sugerir foi que, quem faz o underground são pessoas. Pessoas interagindo. Seja abrindo mão de uma visão mais centralizadora como artista solo, ao montar uma banda. Seja saindo de sua zona de conforto para assistir às bandas novas, em locais novos, em eventos realizados por produtores novos. Seja adquirindo materiais de selos e lojas, tanto as tradicionais como as novas iniciativas.
E quem movimenta o underground, na quase totalidade do tempo, são pessoas – de todas as áreas acima citadas – que não se dedicam exclusivamente ao underground. Pra quem vai a um grande festival, como o recente “Summer Breeze”, pode parecer que só existam executivos, grandes produtoras, agencias de marketing, grandes revistas, acessórias, grandes gravadoras e equipes profissionais de apoio, segurança, socorro e infraestrutura.
E, nessa pequena série, eu quero mostrar bandas onde sequer os músicos conseguem pagar o local onde ensaiam com o arrecadado com a banda. Produtores que, na maioria das vezes, estão felizes quando empatam o investimento. Selos que precisam se juntar em 5 ou 6 para fazer um lançamento de cerca de 300 cópias. Camiseterias e distros onde os próprios donos são os modelos, os estampadores, os divulgadores e, inclusive os office-boys que vão aos correios despachar as encomendas.
Os convidados foram: A banda THRASHERA – ponta de lança do sarcasmo ácido e revoltado que todo headbanger desperto carrega; Os selos Anaites Records e Black Seal, em que duas pessoas, uma em cada caso, controlam todo o processo produtivo, desde o contato, passando pelo design, até a distribuição e divulgação; A produtora Hela Prod., empenhada não apenas em realizar eventos, mas em INCLUIR, em seus eventos, bandas de todo o cenário regional; A banda ETERNAL SACRIFICE e todo seu esmero em construir uma apresentação profunda, absurdamente teatral e artisticamente coerente com o conteúdo lírico;
Ladies and Gentleman, apresento-vos, O UNDERGROUND!
E o protagonista de hoje é a banda THRASHERA e o “Diário de Bordo” do seu mais recente trabalho.
Em 20 de abril de 2024, os cariocas da THRASHERA desembarcaram mais uma vez em São Paulo, para gravar 04 músicas inéditas para um futuro split, que será dividido com duas bandas do underground paulistano.
A saga para a maioria dos integrantes do THRASHERA começou ainda na sexta-feira (19/4), quando saíram do Rio de Janeiro em direção ao Mob Studio, na zona leste de São Paulo.
Durante todo o sábado, dia 20, a banda gravou as linhas de bateria, baixo e as bases de todos os sons. Como já é de costume, a noite do dia 20 foi destinada a uma “confraternização etílica” entre os integrantes, que durou até às 5h do dia 21…E às 10h da manhã do domingo, dia 21, a banda já estava no estúdio:
Foram gravadas 03 músicas e uma introdução. Essa introdução tem relação direta com todas as músicas e trata-se de um aforismo poético escrito pelo vocalista Chakal e pelo editor do Desgraça Zine (Salvador /BA), Robson Desgraça que além de colaborar na construção do texto, recitou e vociferou o conteúdo, trazendo assim uma estética diferente para esse material da banda, pegando referências do cinema de horror brasileiro e da literatura de cordel.
O material ainda terá participações do guitarrista Leandro Wild da banda VINGANÇA SUPREMA (SP) e MD, vocalista da banda GOMORRAA (SP)
Um vídeo mostrando partes do deslocamento da banda do Rio para São Paulo, além de fragmentos da gravação, com a trilha sonora sendo o instrumental, cru e sem mixagem, de uma das músicas gravadas na ocasião, foi montado pelo Edu da Baphomet Design de Vila Velha / ES, figura que também trabalhou nos vídeos que complementam o primeiro DVD do THRASHERA.
O DVD, aliás, está em produção no Darkside Estúdio Recife /PE, a cargo de Diego Do’Urden (MYSTIFIER), que foi o responsável pela gravação do álbum ao vivo do THRASHERA, durante a “Bastardos da Noite Nordeste Tour 2023”. Esse material sairá em cassete pelo selo Auditive Cut Records, em maio de 2024 e em CD através de uma aliança de selos em junho de 2024
Além do THRASHERA, vários dos integrantes tem projetos paralelos, sejam bandas ou mídia: Sürtür Impurus, baterista tem um projeto onde man band chamado SURTUR, que tem dois EPs lançados, além de tocar nas bandas ENEMY CROSS, EMBALSAMADO e PRAGA e, recentemente, entrou para a SATAN’S SIGH; Bode de Sade toca também no ENEMY CROSS e PRAGA; Madcrusher tem um projeto de Death Metal Old School, chamado MALEFIC INCARNATION; e Chakal, além do clássico “METAL REUNION ZINE” e de sua produção como escritor, participa de dois projetos ocultos de Death Metal e Speed Metal, que seguem em construção mas não possuem redes sociais, plataformas de streaming ou interesse em ser divulgados amplamente na mídia underground.
Feita toda a descrição acima, você consegue perceber, caros leitor e leitora, a ESSÊNCIA do que é o UNDERGROUND: As viagens nos finais de semana, após a jornada normal de trabalho; a celebração do modo de vida headbanger; a irmandade entre as bandas participantes; o conluio entre selos para lançamento; produtores e organizadores de evento que também tem suas bandas, selos, estúdios e que se ajudam e complementam entre si; artistas gráficos, poetas, redatores…Tudo isso junto e misturado com o único propósito de fazer o underground girar, de manter a chama acesa. Mesmo sem dinheiro. Mesmo tirando do próprio bolso. Mesmo sem perspectiva de, talvez, não recuperar nem o investimento.
Vai ver é por isso que eu escrevo um texto assim tão longo, mesmo sem a perspectiva de ser lido até o final. Parabéns THRASHERA, parabéns a todos os citados! Graças a vocês que o UNDERGROUND respira!
A banda está postando, em sua página do You Tube, um vídeo desse relato de estúdio. Assista no link abaixo: