HORROR TALES – Conto XVIII: 3001 RELATÓRIO RAL 818903

Por Rodrigo Leonardi

Horror Tales

Confesso que não esperava chegar aqui, nesse ano. Meus planos eram pra ter ido um pouco mais atrás. Talvez voltar no ano 2030, depois de uma pandemia que dizimou quase metade da população mundial. Minha real intenção era ver o que realmente tinha causado tantas mortes nessa época. Sabemos que foi uma pandemia. Um vírus que devastou o mundo e quase todos acima de sessenta anos.

Enfim, como a viagem no tempo de minha época ainda não é precisa, poderia ter ido parar nos tempos jurássicos onde os grandes répteis eram os reis da cadeia alimentar. Era apenas um minúsculo erro e pararia em qualquer canto do planeta, em qualquer época.

Sei que existem viajantes do tempo do futuro. Sei que uns mil anos à frente de minha época essa viagem já pode ser exata.

Sou do ano 3803. Ouvi rumores que no ano de 4000 em diante, os seres humanos já teriam alcançado a vida eterna, já que no ano em que vivo, a média de vida pode chegar em lugares preservados onde os ricos moram, até 300 anos.

Como todo bom viajante no tempo, podemos apenas viajar, mesmo que clandestinamente, já que o governo local proibiu no ano de 2300, pelo fato de dois rapazes terem alterado algum meio ambiente em que passaram.  Mesmo viajando ilegal, ainda mantemos, entre nós, um código de ética que se resume a não deixar ser visto, ou alterar algo nas viagens.

Quero deixar bem claro que ainda não conseguimos viajar para o futuro, mesmo que esse já esteja traçado. Pois ele mesmo existindo, ainda é incerto. Ele pode se alterar conforme alguma fatalidade aconteça.

O que sabemos até agora são rumores, do futuro e do passado. Pois todos os livros de histórias foram queimados quando o mundo se unificou politicamente, fazendo assim que só exista um líder de nação. O Líder Supremo do planeta.

Em 3803, os seres humanos já vivem em outros planetas. Coisa muito comum, já que sou dessa época e quando nasci os humanos já estavam tomando planetas, satélites naturais com seus lares, transformando em bairros de classe alta. Com jatos particulares supersônicos, a viagem da Lua para a Terra demora cerca de quatro horas.

Me chamo RAL. Tenho oitenta e nove anos e fui treinado por JAG. Um experiente viajante que já trabalhou para o governo.

Somos quatro viajantes encaixados no projeto de JAG. Viajamos no tempo e recolhemos informações através de relatórios, para poder entender, escrever, e deixar registrado em livros, fotos e vídeos o que vemos. Mas temos que ser sigilosos.

No ano em que vivo, não temos diferenças de cores, e tamanhos. Em minha época, devido a miscigenação, somos todos iguais fisicamente. A única diferença são o tamanho dos olhos e suas pigmentações. Existem atualmente, devido a alguma mutação no passado, cerca de mais de mil pigmentações diferentes. Sabemos que isso é algo fisiológico, mas ainda não sabemos o porquê.

Como disse em alguma estrofe logo acima, nossas viagens no tempo são incertas. Onde paramos, descrevemos e partimos. Voltando sempre 2 segundos depois de partir.

Esse é o meu relatório do ano 3001. Onde descrevo tudo o que vi nesse ano.

…………………………………………………………………………………………….

Cheguei há esse ano a noite. Cai próximo há um lago deserto. Dava para ver luzes artificiais no horizonte, lembrando uma cidade, como JAG sempre dizia que existia antigamente. o solo arenoso, segundo meus estudos, me informava que estava prestes ao mundo das águas. Podia ser um perigo estar por ali, pois esse mundo às vezes se irritava e jogava grandes ondas para dentro do solo. A única maneira de estar seguro das ondas era quando a cor do solo se mudasse para uma cor mais escura, onde só existia pequenos ciclos de águas, sem ondas, onde havia peixes para alimentação humana.

Resolvi esperar clarear para poder começar meu trabalho. Liguei o cronômetro, do meu relógio. Estava faminto, essas viagens no tempo causam tanto desconforto e desnutrição, que parece que ficara três dias sem comer ou beber algo.

Não trazemos nada de viagem, já que chegamos à conclusão que conseguimos ficar sem comer por dias. Mas bebemos muito líquido… água…

JAG me dissera que a água é o elemento mais importante para nossa existência, assim trazemos um único grande galão de água. Me saciei de água potável e esperei amanhecer. Algumas horas chegara à claridade.

Acordei com a grande estrela amarela quase me cegando, refletindo sobre o para peito brilhoso do bico de meu navio.

Me levanto e saio para fora com uma máscara de oxigênio. A tiro rapidamente, pronto pra colocar de novo se acaso o ar não fosse puro.

O ar é limpo. Consigo respirar tranquilamente. Guardo a máscara e sigo em frente. Horas e horas caminhando sem nenhum sinal de humanos e civilização. Pensara comigo que as luzes que vi quando cheguei estivera mais perto. Não estava, na verdade estava muito longe, já que a planície dava pra enxergar o horizonte muito distante.

Horas e horas caminhando, apenas bebendo pequenos goles de água. Comecei a raciona-la pois não sabia o que aconteceria, ou onde estava. Qualquer coisa volto pro navio e parto embora.

Quase sem esperança de encontrar algo, avisto um avião passando.

Observo ele, a direção em que ele vai. Percebo que estou no caminho certo, continuo a caminhar agora com esperança de encontrar algo.

Entre pequenos morros, subindo e descendo, avisto finalmente um povoado. Algumas edificações verticais, navios com pneus rodando em asfaltos.

Me animo e lembro das informações que tivera. Porém não acreditaria que nesse ano ainda não havia carros voadores.

Do ano em que venho não existem carros terrestres por assim dizer, apenas alguns carros voadores e navios flutuantes como o meu, que foi adaptado para viajarmos no tempo.’

Percebo que a partir dali tenho que tomar cuidado. Posso ser visto, mas não posso interromper em nada. Cada vez me aproximando, analiso onde pudera me esconder. Estou quase entrando na cidade, apenas alguns carros nas ruas. Bem cedo. E=o habito dos horários de trabalhos ainda parece normal, da mesma forma que a nossa e segundo informações, o mesmo padrão de todas as épocas.

Percebo humanos de várias pigmentações, uma diferença enorme entre um e outro. Avistando de longe, não posso ser visto.

Chego próximo há um prédio abandonado, resolvo ligar o modo TRAPTE. O modo TRAPTE é um modo em que suas vestimentas mudam de cor, fazendo com que você fique quase transparente, ou fique da mesma pigmentação de algum cenário em que passe. Por exemplo, se eu passar em um muro sem pintura, ficarei com aquela cor cinza esverdeada. Essa tecnologia se deu há tempos atrás de minha época, tirado de um réptil extinto.

Um camaleão.

Entro na cidade e percebo humanos, poucos deles nas ruas. Alguns edifícios muito altos. Como já havia ouvido falar, tudo bate. Os miseráveis lutando nas ruas para sobreviverem, atrás de restos de comidas em latões transbordados de lixos, disputando com os ratos gigantes que ali havia, e a elite vivendo luxuosamente nos topos dos arranhas céus.

Encosto em uma parede, percebo um humano de terno e gravata. Mas nunca havia visto ou ouvido falar de um igual aquele. Um pouco longe, com um rosto metálico. Aproximou-se, percebi que não era um humano e sim um robô.

Reparo em mais e mais ao meu redor. Percebo que os bem vestidos são robôs, os maltrapilhos são humanos. Tinha ouvido falar que a inteligência artificial dominara uma certa época da humanidade, mas de longe imaginaria ser o ano de 3001. Ando algumas ruas a mais, elas começam a ficar limpas, sem sujeiras, com canteiros de flores que ao meu ver eram artificiais. Quase que em perfeita sincronia, enfileirada de modo que não se achasse sequer algo fora do padrão.

Percebo que estou na época/era dos robôs, androides… era das máquinas.

Nunca ouvimos falar muito bem sobre essa época pois os robôs não conseguem associar bom senso nas coisas. Pra eles são oito ou oitenta.

O que me assusta é essa inteligência artificial capaz de dominar humanos. Algo de diferente eles tinham.

Robôs não aceitam falhas. Justamente nessa retórica em que podemos vencê-los. No meu ponto de vista era simples. A única certeza que tenho é que essa época passará, pois na época em que vivo eles são passados.

Enquanto eu anotava essas palavras em meu relatório, sem perceber, um robô desse estava há um metro de distância de mim me observando, mesmo sem poder me ver totalmente, ele ficou paralisado me olhando. Custei a perceber, quando reparei, apenas fiquei intacto. Ele ainda ficou me olhando sem se mexer um milésimo para lado nenhum.

Ele fala:

-RAL do ano 3803, viajante do tempo. Chegaram longe.

Fiquei quieto.

– Vocês não são humanos, são protótipos de nossas experiências. Chegaram longe pois nunca imaginaríamos que vocês conseguiriam fazer uma viagem no tempo.

Fico quieto.

– Sua raça vai ser dizimada como muitas outras. Volte para seu tempo. Lhe dou algumas horas antes de aniquilá-lo.

– Lembre-se, vocês são apenas um experimento, não são humanos cem por cento, apenas algumas células, são ciborgues. Essa informação eu vou deixar você compartilhar no seu relatório, pois, graças a ela sua espécie começará a ruir.

O robô sai andando. Me apresso para ir embora, assustado e sem saber o que pensar. JAG ficará surpreso com minha descoberta. Agora cabe a mim decidir se conto ou não sobre essa conversa pois, se contar, posso estar colocando minha espécie em risco.

Publicado originalmente na Antologia, Dystopia, pela Editora Dark Books. Organizador da antologia: Fagner Vieira. 2021).

Rodrigo Leonardi.

Escritor, músico e entusiasta do cinema.

Como escritor, tenho 5 livros publicados, participação em diversas antologias.

Como músico, fui baixista e vocalista da banda Abuso Verbal e atualmente vocalista da banda de Metal Punk “Roto”.

No cinema, já escrevi críticas para o site Cineset, diversos fanzines como, Sindicato dos Assassinos e também divulgo análises no feed do meu instagram.

@rodrigoal81/