Infestação

2023 - Terror - 106 minutos

Cinema

Por: Ivan Rios (*)

TÍTULO ORIGINAL: Vermines | Ano de Produção2023 | França

DIREÇÃO: Sébastien Vanicek
ROTEIRO: Sébastien Vanicek, Florent Bernard
ELENCO: Théo Christine, Sofia Lesaffre, Jérôme Niel, Lisa Nyarko como Manon, Finnegan Oldfield, Jean-Pascal Zadi, Oulaya Amamra, Benoît Poelvoorde
PRODUTORA:My Box Films
DISTRIBUIDORA: Paris Filmes
Duração: 106 min

SINOPSE: Kaleb, um jovem prestes a completar 30 anos, está enfrentando problemas familiares e pessoais. Ele está brigando com sua irmã por uma questão de herança e cortou relações com seu melhor amigo. Apaixonado por animais exóticos, Kaleb decide levar para casa uma aranha venenosa. No entanto, a aranha escapa e começa a se reproduzir rapidamente, transformando o prédio onde ele mora em uma verdadeira armadilha mortal. À medida que a infestação se espalha, Kaleb e os outros moradores do prédio precisam lutar por suas vidas contra as criaturas mortais que agora habitam o local.

RESENHA (**):

Mantidas suas devidas proporções, e levando-se em consideração que cada indivíduo age subjetivamente e de forma diferente a inúmeras situações, o que se espera de um filme como “Infestação” é nada menos que muito humor e comicidade involuntária. Embora tenha um repertório autoral magnífico em mãos, a obra descamba para uma falta de originalidade aberrante.

Vai aqui o aviso de gatilhos para quem tem fobia ou sente formigamentos e vê animais peçonhentos subindo pelo corpo apenas ao assistir tais cenas. Isso aqui tem de montão. E estou dando esse alerta para o seu bem. Mas voltando à obra em si, o filme, apesar de possuir uma bela fotografia, nada tão esplendoroso, mas belo, acaba esbarrando em um problema colossal que é “querer se levar a sério demais“.

Embora o filme traga logo de cara um clássico do gênero, “Aracnofobia” (1990), a expectativa fica só por isso mesmo. O que se vê em geral é um elenco totalmente desajustado e uma ausência de coesão narrativa. Além disso, os diálogos entre os personagens são infindáveis e “sem pé nem cabeça”. Sabemos que é um filme francês, e como todo filme francês, em geral, tem como característica diálogos profundos e imersões filosóficas, sociológicas e politizadas. No entanto, vemos o esboço de tudo isso de forma muito mal feita e não apropriada.

A sensação de que o filme tenta abraçar tudo e, ao mesmo tempo, acaba abrindo mão de tudo e não atingindo foco nenhum é nítida. No afã de querer abordar inúmeros temas transversais ao terror, o diretor Sébastien Vanicek, que também assina como roteirista ao lado de Florent Bernard, cria uma narrativa perdida. O filme é repleto de pontas soltas, diálogos inúteis e desconexos, além de um pseudodramalhão ordinariamente mal executado.

Não que a audácia em tentar abordar inúmeros temas seja em si um problema. Muito pelo contrário, é o que possibilitaria revezes e “mudanças de chave” dentro do filme, tornando o contexto muito mais sedutor. No entanto, tudo aqui parece que tinha tudo para dar certo, mas acabou desandando geral. O excesso de zelo em tentar produzir um filme com múltiplas e complexas camadas acaba transformando a obra em uma tremenda “pataquada”.

Em dado momento, o espectador certamente se perguntará: que diabo de filme eu estou assistindo agora? A tentativa de criar um ambiente claustrofóbico e opressor, que poderia ser um ponto forte do filme, se perde em meio a uma direção confusa e uma montagem que não favorece a tensão necessária para um bom filme de terror. A sensação de perigo iminente, que deveria ser constante, é diluída por cenas mal construídas e uma trilha sonora que não contribui em nada para a atmosfera de suspense.

Outro ponto que merece destaque é a caracterização dos personagens. Em um filme onde a interação entre os moradores do prédio deveria ser um dos pilares da narrativa, o desenvolvimento superficial dos personagens faz com que o público não se importe com o destino deles. A falta de profundidade nas relações e nos conflitos internos dos personagens torna difícil para o espectador criar uma conexão emocional com a história.

A escolha de uma aranha como o principal antagonista também poderia ter sido explorada de maneira mais criativa. Em vez disso, o filme recorre a clichês e sustos previsíveis, sem inovar ou trazer algo novo ao subgênero de terror com aracnídeos. A aranha, que deveria ser uma presença aterrorizante, acaba se tornando apenas mais um elemento genérico em um filme que não consegue se destacar.

A direção de arte, embora competente em alguns momentos, não consegue sustentar a atmosfera de horror necessária. Os cenários, que poderiam ser usados para criar um ambiente mais opressivo e assustador, são subutilizados, e a fotografia, apesar de bela, não consegue compensar as falhas narrativas e de direção.

O filme traz referências relevantes que nos fazem lembrar “REC” (2007) e “A Morte do Demônio – A Ascensão” (2023). Além disso, tenta flertar com uma crítica de engajamento político, pincelando aspectos relacionados às desigualdades sociais. No entanto, peca horrivelmente nas próprias intenções. A forma grosseira e rude como os personagens centrais tratam os demais moradores do prédio chega a ser algo pavoroso e suplanta em definitivo qualquer relevância ou empatia que o filme possa suscitar.

É uma pena que a obra tenha se distanciado tanto do seu propósito e se perdido em meio às próprias expectativas. Embora a escola francesa de cinema tenha nos brindado com clássicos memoráveis como “Mártires” (2008), “Infestação”passou longe de atingir qualquer patamar semelhante. A tentativa de criar um filme de terror com múltiplas camadas e profundidade acaba se transformando em uma experiência frustrante e desconexa.

Por fim, “Infestação” é um exemplo de como uma boa premissa pode ser desperdiçada por uma execução falha. A falta de coesão, a direção confusa e o roteiro mal desenvolvido fazem com que o filme não atinja seu potencial. É uma obra que, apesar de suas boas intenções, acaba se perdendo em meio a suas próprias ambições, deixando o espectador com a sensação de que poderia ter sido muito mais do que realmente é.

*Ivan Rios: O Mago Supremo é sindicalista, historiador, crítico de cinema, escritor e graduando em Direito. Ivan é um militante cultural ativo no Estado da Bahia. Além disso, ele é membro do Comitê Baiano de Solidariedade ao Povo da Palestina. Em 4 de dezembro, a Câmara Municipal de Santo Antônio de Jesus (BA) homenageou-o com a Medalha Pedro Kilkerry, reconhecendo seu compromisso com a cultura, justiça e solidariedade. Inspirado pelo poeta simbolista Pedro Militão Kilkerry, Ivan Rios continua a contribuir para a sociedade compaixão e dedicação.

Instagram: @ivansouzarios

** Resenha originalmente publicada no site Cine Horror.