ONOSKELIS – Before Ishtar´s Portal

CD 2023 - Mutilation Records / Black Hearts Records

Álbum

Nos anos noventa eu passei a admirar um tipo de som que não era propriamente Metal, mas que tinha um flerte com o metal de tal forma que muitas figuras do underground, muitas do Black Metal, criaram projetos seguindo uma linha que na época ficou conhecida como Dark Atmosphere ou Black Atmosphere e essa experiencia que tive foi com um projeto norte-americano chamado Shadowcaster criada pelo guitarrista Mikael Bayusik (Tearstained, Night Conquers Day and Into the Sunless Meridian, Buried Beneath), extremamente underground e tinha uma sonoridade verdadeiramente macabra, que sempre me remetia ao Satanismo… e era.

Depois que conheci o Shadowcaster, coincidentemente, eu li uma entrevista do David Vincent (Morbid Angel/ Vltimas) declarar que era fã do Dead Can Dance, me despertando uma imensa curiosidade sobre e fui buscar, depois que conheci o Dead Can Dance, eu tive um excelente mestre de música obscura chamado Denival Soledade, que trabalhava numa notória loja de Metal aqui de Salvador/Ba chamada Coringa, que passou a me apresentar não só o Dead Can Dance como Enia, Loreena McKennitt, Love Spirals Downwards, Manic P., Chandeen, Stoa e outras ligadas a cena Dark Wave. Já do lado que poderia chamar de Metal conhecemos o Mortiis que acabara de deixar o Emperor e dar vida ao seu projeto com o magnânimo segundo álbum chamado “Ånden som gjorde opprør”, e um outro projeto do mesmo Mortiis chamado Fata Morgana que lançou álbum homonimo; Equimanthorn que era um projeto de dois integrantes do Absu – Proscriptor e Equitant – lançou um álbum fantástico na época “Nindinugga Nimshimshargal Enlillara”, assim como Vond, Aghast, Elend, Ordo Equilibrio, Pazuzu (AUS), Evol (ITA) e Proscriptor que lançou um álbum não menos maravilhoso chamado: “The Venus Bellona”, de 1995.

Bom, todo esse conhecimento sobre esse estilo de som sombrio, por vezes medieval, por outras ligados a atmosferas aterradoras, outras mais depressivas, tristes, solitárias, porém, na maior parte das vezes negativa, foi algo que me estimulou inclusive a criar meu próprio projeto chamado Aborym que chegou a lançar duas demos e tinha projetos de gravar um álbum engavetado até hoje. Recordo-me que lendo o release do Shadowcaster eu pude perceber de onde ele havia se inspirado e ele dizia textualmente que havia sido na música “Tears in a Prophet’s Dream” do álbum “To Mega Therion” 1985, do Celtic Frost. Ali eu pude entender o que ele queria dizer e a ideia genial de fazer gravações somente com aquele tipo de som que simulava ruídos, sons naturais, ruídos com a voz e letras obscuras, genial!

Aqui no Brasil também surgiram bandas com esse perfil do Shadowcaster e posso citar a carioca Aeternum Maleficium, por exemplo e Morbid Prelude de Minas Gerais. Toda essa introdução para falar do lançamento do primeiro álbum de estúdio dessa veterana do underground que já integrou a banda Intelectual Moment, uma das bandas mais efetivas do underground Black Metal dos anos 1990 como guitarrista e vocal. Ainda nos anos 90, Belliarth lançou duas demos “The Golden Temple of Onoskelis” e  “The Hecate Prophecies in Your Cold Throne” com seu projeto Onoskelis em 1997, que recentemente foram reeditadas em formatos analógicos: k7 e Lp, ambas no mesmo registro e, finalmente, alcança seu ápice de carreira lançando “Before Ishtar´s Portal”, um álbum magnifico repleto destas referencias que citei acima e, quero crer que outras, já que estagnei no tempo e não continuei acompanhando as bandas que surgiram ou até materiais da vasta discografia das bandas que citei no início da resenha.

O que tenho em mãos é um material muito rico musicalmente, onde podemos sentir uma presença marcante da musicalidade oriental, sobretudo a védica, num turbilhão de momentos que mesclam calmaria, outros tormenta, aliados a vocalizações delicadas da voz de Belliarth. Material muito bem-produzido, uma captação bem incisiva e cristalina do que ela se propôs, aliás é muito incomum para a cena Metal absorver tal tipo de som, digo isso porque a maioria das bandas que citei não são do agrado da maioria, no Brasil, ou mesmo escutar as introduções dos álbuns, em geral se pula logo.

O álbum abre com Summoning the Spirit of the Flamming Phoenix daquelas músicas que remetem imediatamente ao Darkwave, com percussão indiana e muitos arranjos extraordinários que caberiam facilmente em trilhas sonoras de filmes épicos, mesclados com vozes solfejando coros intensos seguida por Ishtar – the Akkadian Matron uma faixa repleta de mística e traços de oriente médio, uma sonoridade árabe e árida – se me permitem o trocadilho. As letras são muito bem escritas e compõem justamente a atmosfera do oriente como pretende a temática do álbum.

A título de curiosidade, é importante ilustrar a abordagem de Inana – deusa mesopotâmica que no reino da antiga Suméria passou a se chamar Ishtar – que como Ishtar, é a figura central da temática do álbum, vale fazer essa intercessão – que no álbum se faz muitas narrativas poéticas sobre a deusa cultuada por acadianos, babilônios e assírios. Inana/Ishtar equivaleria a deusa da fertilidade, erotismo, amor, fecundidade etc., seu legado é tão antigo que foi fonte de inspiração para que os gregos utilizassem suas características para adjetivar Afrodite, até mesmo os hebreus a usaram como referência para traduzir aquela que chamavam de Astarte.

A arte do álbum também não pode passar despercebida, pois trata-se de uma maravilhosa pintura feita pela artista chilena Silvana Massa. Além da belíssima capa, o encarte não deixa por menos, com lindíssimas fotos de Belliarth em vários momentos e, diria, personagens, hora Deusa, hora Amazona, hora Rainha fazendo jus ao seu enredo todo especial deste material. Ainda sobre a arte do disco, trata-se de um digipack com hotfoile na frente e no verso, encarte conta a história da Deusa Inana e depois temos os poemas que revestem as músicas deste fantástico álbum.

É de primaz importância deixar claro que o que temos em mãos é um material de primeira qualidade em todos os seus sentidos e sei que Belliarth fez um trabalho com muito afinco e dedicação, a produção ficou a cargo da própria Countess Ruth Belliarth e Gregoree Junior, além de duas das oito letras terem sido escritas por Sammael Mictian, a faixa dois Ishtar – the Akkadian Matron e a faixa três Ishtar II – the Goddess Ascension a Spark from the Star. Sem sombra de dúvidas, “Before Ishtar´s Portal” é um álbum digno de estarem na mesma galeria do Mortiis, Elend, Loreena McKennitt, Enia e Dead Can Dance.

Lista de faixas:

  1. Summoning the Spirit of the Flamming Phoenix
  2. Ishtar – the Akkadian Matron
  3. Ishtar II – the Goddess Ascension a Spark from the Stars
  4. Constelation of Triumph
  5. The Golden Temple of Onoskelis
  6. The Hecate Prophecies in Your Cold Throne
  7. Misnathropic Spectrum
  8. Stellar Secrets Unveiled by the Cosmic Ballet

band contact: @onoskelis_official