HORROR TALES – Conto XV: A Residência

Por Rodrigo Leonardi

Horror Tales

Depois de muitas horas de carro, consegui chegar na residência onde o mapa apontava. Recebera uma carta de um velho amigo para visita-lo, amigo esse que não via desde os tenros anos de colegial, onde matávamos aulas para fumar escondido próximo a horta que a escola havia feito- uma plantação de tomates – uma estufa cerca de três metros de largura por aproximadamente 32 passos largos no qual, chegara à conclusão que ela tinha pouco menos de 32 metros de cumprimento. Fizera essa analise desnecessária, pois era assim que minha mente funcionava – e funciona até hoje – no qual me lembro de tentar chegar as conclusões de medidas de distância através dos passos.

Logico que não era exato porem, lhe dava uma boa dimensão, tanto que, chegara há menos de trinta e dois metros, tentando ser preciso – o que de fato estava longe de ser – porem um bom método de percepção rápido e também, um ótimo exercício mental.

Voltando ao meu amigo, me enviara um e mail pedindo minha presença em sua residência. Ela ficava nos campos próximos há uma grande plantação de ervilhas no qual, acredito eu, que sua própria família as cultivava.

Seu nome era Rodolpho, com ph. Pensara eu que o nome com o ph devia ter sido herdado de algum parente no qual vivia em épocas em que se usava ph ao invés do f.

Fazia muito tempo que não o havia, cerca de vinte anos ou mais. Também não sabia muito sobre ele pois meu último contato foi no colegial. Depois disso me mudara para outra cidade, ele também. Parece que agora voltara para casa da família por algum sério motivo, no qual ele não especificou no e mail. Apenas disse que precisava falar comigo, e que era uma conversa séria.

Como fazia muito tempo, não temi mal algum pois não tínhamos mais contatos e tudo o que fizemos quando éramos jovens foi mesmo matar aulas e conversar sobre as garotas. Pensara isso pois um medo veio dentro de mim, pensando que Rodolpho poderia estar me atraindo para uma tocaia ou algo assim. Não se sabe mais quem é quem no mundo estranho de hoje em que vivemos. Cheio de doenças mentais que assolam a sociedade. Problemas esses talvez de mudança de personalidade ou coisa do tipo.

A residência era um grande casarão feito de peroba, com dois andares. Uma casa muito grande e não convencional, digamos, culturalmente falando em nossos terrenos. Parecia uma casa mal assobrada. Talvez fosse.

Teria sido um erro ter vindo? Pensei encostado no carro, ascendendo um cigarro e admirando a arquitetura. Parecia uma cena de um filme – de terror – um lugar distante, um casarão velho, pequenas moitas de mato nos cantos dos alicerces, provava que estava abandonada há um certo tempo.

De repente uma sensação ruim me afaga. Na verdade, não saberia dizer se fora ruim ou não, mas era totalmente ao contrário de ser uma boa vibração.

Talvez meu cérebro estava me mandando esse sinal. De que forma? Não fazia ideia. Me pego pensando de como funcionamos e de como poderia sentir algo ruim sobre um lugar que eu nunca estive antes. Mais uma análise se inicia em minha cabeça – acredite – lembro-me de documentários sobrenaturais e revistas desse mesmo gênero que folheava. Lembro-me de vários casos estranhos envolvendo espíritos, espectros ou possessões. Afirmo em minha mente que tudo se identifica as leituras que tive sobre esse assunto. Tudo.

O cenário era perfeito para tal ocasião. Começam então, – automaticamente em meu cérebro – a analisar a casa. Grandes janelas de madeira tratada na parte de baixo, apenas três janelas na parte de cima. No entanto, uma das janelas de cima, especificamente a da esquerda, seguindo minha posição, estava quebrado um de seus vidros. Eram pequenos vidros, de dez por dez centímetros. Havia cerca de trinta vidros desses em cada uma.

Definitivamente penso que estava abandonada já que, por esses lados, em campos abertos tende a fazer mais frio do que na cidade. Campos abertos onde as brisas e os ventos trafegam sem paredes ou arvores para barra-las.

Acabo meu cigarro. Não me importo de jogá-lo ali mesmo, no chão de terra onde tivera uma grama seca pouco tempo antes – acreditara eu.

La vamos nos tocar a companhia. Como sempre, conto meus passos. Do carro até a porta dei quarenta e oito passos largos, no que corresponde a minha analise – pouco menos de quarenta e oito metros.

Já na grande varanda, me posiciono em frente a porta de entrada. Uma companhia ao lado. Não funciona, nem cheguei a testá-la, pois estava tão desbotada, encardida de poeira que conclui que ia ser em vão.

Bato na porta. Ela se abre sozinha. Se acalmem nobres leitores. Não foi nem um tipo de sobre naturalidade. Ela apenas estava aberta. E de certa forma, o terror ainda não chegara sua vez de entrar nessa história. Talvez ele nem entre, apenas pode ser uma visita há um amigo. Também não sei o que acontecerá nas próximas linhas – então, vamos seguir em frente.

Abandonada, com muita poeira, próxima observação. Escuro de não se enxergar a um metro de distância. Luzes apagadas e um cheiro de mofo horrível.

Escuto um sussurro chamando meu nome. Firmo as vistas e encontro. Rodolpho estava sentado na poltrona no canto da grande sala, uma espécie de escritório no mesmo ambiente. Enrolado em um cobertor velho, de outra época ele sorri.

– Você veio. Estou feliz por isso. – disse Rodolpho com um sorriso já quase sem dentes em sua boca.

Me aproximo dele e me conforto com a situação. Não era nada parecido com os filmes de terror ou nas leituras sobre fantasmas. Ele realmente estava ali. Era real.

Chego à conclusão de que não estou sonhando, pois de fato me lembro de sair de casa, ligar o carro e vir até aqui. Sonhos sempre começam no meio, nunca sabemos porque fomos parar em tal lugar.

De fato, não era um sonho. Era realidade.

O saúdo com um abraço. Sento-me ao lado dele. Conversamos muito.

Pergunto o porquê de tanto tempo depois, me enviara um e mail para me ver.

Ele faz um gesto para eu ficar em silencio, depois fala:

– Por enquanto não quero falar disso. Quero me lembrar de quando éramos jovens. Não me lembro de muita coisa. Se você se lembra, me conte? – falando com um certo entusiasmo e uma certa curiosidade também.

-Bem…. – Começo e lembrar.

Ficamos à tarde inteira até o anoitecer conversando. Na verdade Rodolpho apenas me escutava, não falava muito. Sua voz era fraca e sua palidez e olheiras apontavam o quão doente ele deveria estar.

Logo a noitinha, penso eu, ele só queria uma companhia para relembrar sua juventude que tivera sido tão boa. Analisando rapidamente, imaginava que sempre fora solitário em sua vida. Não sei ao certo. Ao que me parece estava ali sozinho.

Foi quando Rodolpho se levanta e diz ir buscar um refresco na geladeira. Pelas condições do homem, me propus a fazer isso por ele, que nega.

Fico ali sentado, esperando a volta dele. Ouço barulhos que vinha da cozinha. Certamente Rodolpho estava lá pegando algo. Concluo que tudo aquilo era real. Fazia sentido de certa forma em minha cabeça. Talvez o sério assunto era só pra que eu não faltasse a visita, só para não o ignorar e vir até aqui. Talvez ele só queria mesmo conversar, se lembrou da juventude e acabou se lembrando de mim pois como já disse antes, éramos bons amigos.

Me levanto já mais confortável, avisto uma penteadeira. Um tanto incomum um móvel desse em plena a sala de estar de uma casa. Elas geralmente são antigas e costumam ficar nos aposentos por assim dizer.

Me aproximo dela sem contar os passos – isso remete ao conforto que já estava sentindo por ali – várias fotos de família. Fotos em preto e branco de seus antepassados, acreditara eu. Admiro uma a uma, lembrando que todas elas já se foram para outro plano espiritual. Fixando os olhos nos retratos, vendo as expressões de cada um. Estavam todos mortos.

Passo o olho e avisto uma fotografia que me deixa um pouco confuso. Quatro rapazes em um retrato bem velho, percebia as pontas amareladas e uma cor de tom gasto nela.

Reparo bem e vejo Rodolpho nela.

Reparo melhor, sim é ele mesmo.

Me tomo por um frio na espinha, acompanhado de arrepios em minha nuca.

Começo a murmurar repetidamente um “não pode ser, não pode ser… “

Não fazia sentido. Corro para a cozinha e não vejo Rodolpho. Apenas avisto seu andador, apenas isso.

Fico em choque. Torno a voltar nas fotografias.

Tenho uma vaga lembrança das fotos antigas de família onde, no verso costumavam escrever algo nas fotografias. Coisas como os nomes de quem aparece no retrato ou algo com a data em que foi tirada. De caneta mesmo.

Arranco mais que depressa a fotografia da porta retrato. Tiver sorte – aliás, sorte em ter algo escrito, azar em ver o que estava escrito – tinha quatros nomes – Antônio, Roberto, Rodolpho e Rodrigo. E uma data… 20/09/1911.

Respectivamente o nome de Rodolpho estava em terceiro. Voltando a foto o homem que se parecia com Rodolpho era o terceiro. Mas o que mais me chamou atenção era o quarto membro, o do canto direito… Rodrigo. O mesmo nome que o meu. Reparo bem, estava com uma boina típica da época, sem barba.

Chego à conclusão eu era eu. Sem barba, cabelos curtos e com aquela boina.

Entro num estado letárgico, incapaz de me mover. Nem que quisesse andar não conseguiria. Deveria saber que algo não estava certo. Atencioso que sempre fui, só fui me dar conta do andador que estava ao meu lado quando Rodolpho o pegou para se locomover. Não era da minha essência deixar escapar algo assim.

Estou sonhando, começo acreditar. Sempre tenho longos sonhos. Coisas horríveis com a morte e o sobrenatural.

Me sento no sofá, convicto de que é um sonho.

Espero até acordar. Posso achar alguma faca e me matar, nos sonhos isso simplesmente me acordará.

Mas algo em minha consciência me diz que já fiz isso umas dezenas de vezes… e foi em vão.

Resolvo esperar…. talvez toda a eternidade…

(Publicado originalmente na Antologia, Histórias de Horror Brasileiras, pela Editora Obook. Organizador da antologia: Donnefar Skedar. 2022)

Rodrigo Leonardi.

Escritor, músico e entusiasta do cinema.

Como escritor, tenho 5 livros publicados, participação em diversas antologias.

Como músico, fui baixista e vocalista da banda Abuso Verbal e atualmente vocalista da banda de Metal Punk “Roto”.

No cinema, já escrevi críticas para o site Cineset, diversos fanzines como, Sindicato dos Assassinos e também divulgo análises no feed do meu instagram.

@rodrigoal81/