Aqui temos a honra de sermos um dos poucos veículos de mídia underground a conseguir entrevistar uma das bandas mais misteriosas da cena brasileira. É raro a aparição destes demônios nos manuscritos do underground, porém é com muita satisfação que os trazemos para falar um pouco sobre seus trabalhos, a questão ideológica, seus processos construtivos, experiencias, lançamentos, análises e tudo que cerca essa ode ao obscuro chamada Hinarivm.
Saudações nobre, é com muita honra que vos trago neste maldito pergaminho. Para iniciarmos apresentando a horda. Ela surgiu por volta de 2017, lançou sua primeira demo no ano seguinte, peça que se tornou rara e, somente cinco anos depois lança seu primeiro álbum, nos conte sobre essa trajetória.
Void Est Aur – Saudações. Agradeço o interesse em realizar esta entrevista.
A Hinarivm surgiu em 2017 e, como mencionou, lançamos a nossa demo, “Et Sapientia …” com quatro músicas no ano seguinte em formato pro tape limitada em 100 cópias. A distribuição foi realizada pela Nekrokaos Distro.
A maioria das músicas para o primeiro álbum já estavam compostas entre 2018 e 2020. Devido a percalços com o estúdio onde começamos a gravar, precisamos abandonar e refazer a maioria do trabalho, o que gerou um atraso nas captações para o lançamento. Esse atraso acabou sendo providencial porque realizar a captação das cordas, voz e mixar o material no HellsPass Estúdio foi fundamental para a qualidade sonora do álbum “Vltra Terminvm Creatvrae ex Lvcifer Coronatvs”, que foi lançado pela Black Hearts Records em março de 2023 e.v.
Nos últimos anos, temos percebido que muitas bandas nacionais vêm se consolidando no underground e aperfeiçoando muito suas bases musicais e seus conceitos, de onde a Hinarivm extrai suas inspirações musicais e literárias?
Void Est Aur – As inspirações musicais da Hinarivm estão calcadas no Heavy Metal em geral e nas intuições sonoras que ocorrem naturalmente com determinadas sensações. O nosso verbo está intimamente relacionado com a liberdade e sua faísca imorredoura que queima por dentro. Mesmo que você esteja completamente “morto”, ou “cego e surdo” da ascensão desta, alcançando o nexo entre o eu e a consciência externa, sobretudo com o conhecimento oculto que nem todos conseguem provar e o caminho que a maioria evita trilhar.
Em suma, o lírico do Hinarivm é parte de um processo que se manifesta dentro dos meus esclarecimentos filosóficos e espirituais.
Individualmente você mantém um trabalho com arte na pele (tatuagem) e elabora arte gráfica para a cena underground, como iniciou esse processo de trabalho e como chegou ao território das tatuagens?
Void Est Aur – Eu desenho desde a minha infância, trabalhei como arte finalista na adolescência, sempre tive uma pujante criatividade e afeto pela arte e comecei a tatuar os amigos mais próximos de forma amadora. Com motivações fundamentais iniciei no mundo da tatuagem de forma profissional em 2012 e, desde então, mantenho meus estudos em diversos estilos artísticos e me dedico ao dark surrealismo preto e cinza. Atualmente estou tatuando em Sorocaba (SP) e mantenho agenda em Belo Horizonte (MG).
Desenvolver artes exclusivas para a cena underground não foi algo planejado, tanto que não é um trabalho que eu promovo com frequência.
Como seu trabalho como artista plástico/gráfico intervém nas ações com a Hinarivm?
Void Est Aur – Como artista plástico e gráfico eu pude ilustrar todas as artes que constam nos materiais físicos da Hinarivm, o que representou uma grande satisfação pessoal já que pude retratar parte das ideias que havia pensado fazendo conexões com as letras e o conceito do álbum. As ilustrações no álbum são como fragmentos ilustrados para uma melhor compreensão do que está descrito, como uma chave para a imersão no conceito de cada letra.
Falando sobre seu primeiro álbum, pudemos perceber que ele teve um imenso cuidado gráfico assinado por você, e a arte do encarte nos remete aos grimorios medievais, os livros de magia, por outro lado os hinários são livros com canções (em geral gnósticas), qual a relação, por tanto, entre a arte gráfica do álbum, o nome da horda e os conceitos líricos? Onde podemos encontrar estas conexões?
Void Est Aur – A pergunta foi autorrespondida em seu contexto. O nome Hinarivm foi escolhido por fazer alusão aos livros com as letras das canções e o tanto o conceito de arte como o formato do encarte foram idealizados para criar a sensação de se estar manuseando um artefato como este. “Vltra Terminvm Creatvrae ex Lvcifer Coronatvs” bem como qualquer obra do Hinarivm será uma coleção de hinos e cânticos relacionados à expressão criativa dos meus conceitos e nossa ideologia central que é o luciferianismo.
Ainda sobre o álbum “Vltra Terminvm Creaturae”, como se deu o convite para que Cavalo Bathory (The Black Spades, Vobiscum Inferni, Amasarak) participasse das gravações na faixa “In Cinis Mortiis”?
Void Est Aur – Fui guitarra session em algumas apresentações ao vivo com a horda “The Black Spade”, na qual Cavalo Bathory é o front beast e, durante os ensaios surgiu a ideia de convidá-lo para participar da faixa “In Cinis Mortiis”. O Cavalo, além de um grande irmão, tem vocais poderosos e expressivos.
Musicalmente, como você descreveria o som da Hinarivm para alguém que nunca o escutou?
Void Est Aur – Hinarivm executa um Black Metal com atmosfera densa em uma abordagem mais crua com ênfase na melodia e no ritmo, alternando entre momentos mais melódicos e passagens mais rápidas. O lírico e a música trabalham juntos criando um clima único.
A banda, a meu ver, tem uma atuação no underground deveras misteriosa, percebo poucas declarações, aparições, isso faz parte de algum tipo de ação prevista por vocês ou são ações naturais, que se encaixam na “doutrina” da banda?
Void Est Aur – Nós gravamos a nossa demo, fizemos três apresentações ao vivo – N.K.K 21/04/2018, Hordes of Chaos 14/12/2018 e o P.L.E.S 25/01/2020, um pouco antes da pandemia. Logo após a demo “Et Sapientia..,” concentramos nossas energias na composição do “Vltra Terminvm Creatvrae ex Lvcifer Coronatvs”, que era algo mais importante e durante esse período nos encontramos em um vasto mundo cheio de possibilidades e caminhos diferentes. A nossa atenção, portanto, era exclusiva para composição do álbum e esse foi basicamente o motivo de não termos nos apresentados mais vezes e negado alguns convites. Agora com o álbum lançado, já temos um show marcado no “Devotion Mortis II”, que ocorrerá no dia 4 de novembro de 2023 em São Paulo ao lado dos aliados do Lábar’Oculto, Amazarak e Blazing Corpse.
Na leitura do encarte do álbum é possível notar o uso da língua inglesa, português e latim, como se deu essa ideia de mesclar línguas e transmitir essas questões através destes verbos?
Void Est Aur – Mesclar as línguas das letras para o “Vltra Terminvm Creatvrae ex Lvcifer Coronatvs” ocorreu espontaneamente. Aprecio bastante o latim e a forma como ele derivou em outras gramáticas e dialetos. As letras em inglês foram uma experiência que tive no início do Hinarivm tanto que são as letras da demo “Et Sapientia…” Eu me sentia, porém, bastante limitado. Diferentemente do português, que é uma língua flexível e que as palavras têm várias formas dependendo do contexto e da função gramatical. Isso permite uma variação maior com a estrutura das palavras e a criação de versos mais complexos e sonoramente ricos. Os diferentes tempos verbais, modos verbais, gêneros, números e casos gramaticais oferecem um vasto leque de opções poéticas. Em resumo, a língua portuguesa do Brasil é uma língua rica e poética, com seu léxico diversificado, estrutura gramatical flexível. Ela oferece um vasto território para a expressão criativa.
A formação da banda é composta por integrantes que também atuam em outras bandas, alguns inclusive em mais de duas ou três bandas, como se dá a conciliação destas atuações em, certamente, bandas com direcionamentos musicais diferentes, letras, talvez até na questão ideológica mesmo…?
Void Est Aur – Devemos começar com a seriedade e caráter ideológico, esse é um fator muito importante. Todos os membros compreendem o significado oculto do simbolismo que usamos. Desta forma, cada um possui uma percepção semelhante em termos ideológicos, caso contrário, só gastaríamos o nosso tempo em um trabalho totalmente inexpressivo e vago.
Nunca tivemos problemas em questões ideológicas e tampouco com a vertente musical das bandas dos demais membros, uma vez que todas elas estão dentro do metal de forma sincera com seus princípios.
A gnose é um aspecto muito presente nas bandas de metal negro nos últimos anos, muitas bandas inverteram os papeis em que a música era um veículo de exortação, e muitas hoje consideram a música um instrumento de manifestação gnóstica, qual a postura da Hinarivm em relação ao que propaga, exortação, gnose, ambos, nenhum deles?
Void Est Aur – A música da Hinarivm é uma manifestação pessoal, é um estado de expressão quem vem de dentro, mesmo considerando as influências por forças externas, e a maneira como lido e enxergo este mundo, que está estruturado para ser mostrado vil e vazio, marcado pela herança torpe do dogma abraâmico, somado a práticas pessoais que me ajudam a conectar com essa fonte, deixando fluir uma pequena fagulha do meu processo evolutivo em decifrar o desconhecido em algo tangível como a música. É parte de mim e é algo que flui de mim para a música, longe de qualquer tipo de doutrinação dogmática e ideológica ou conversão de valores individuais.
A arte em si, é um canal de manifestação humana muito peculiar e expressa através de poucos, diria escolhidos, e a arte que nos cerca, assim como todas, está fadada a ser criticada sob vários aspectos: estéticos, ideológicos ou mesmo artísticos puramente. No que tange esse pensamento, a arte musical que a Hinarivm propõe é uma substância que se materializa através da arte que enseja?
Void Est Aur – A música é uma forma universal de expressão que transcende barreiras culturais, linguísticas e temporais. Ela possui o poder de evocar emoções profundas, e transmitir mensagens complexas de maneira única. A arte musical do Hinarivm não pode ser interpretada a uma única substância ou forma, pois a experiência é altamente subjetiva e pode variar de pessoa para pessoa. Como qualquer outra arte, no nosso caso é uma maneira de manifestar os nossos sentimentos, visões e compartilhar parte da experiência que alcançamos na nossa vida com a Arte e a Magia diretamente: a quem tem olhos para ver e ouvidos para ouvir.
Voltando a falar sobre o álbum, como está o processo de divulgação dele? Soube que em breve vocês farão uma apresentação, vocês têm intenção de tocar em outros lugares para ampliar essa divulgação ou as apresentações também serão raras por questões interiores a organização da banda?
Void Est Aur – O “Vltra Terminvm Creatvrae ex Lvcifer Coronatvs” foi lançado pela Black Hearts Records, um selo profissional que apoia a banda em todo o processo de divulgação, além daquela que a própria Hinarivm preconizou e as manifestações de apoio das pessoas que escutaram o álbum e o propagam.
Como comentei anteriormente, vamos tocar no dia 4 de novembro na Capital de São Paulo e se houver vontade e cooperação de produtores de eventos sérios, com certeza iremos nos apresentar mais.
Por fim, deixo aqui o espaço aberto para se despedir dos leitores e falar o que desejar, volto a agradecer pelas respostas e por toda atenção dispensada.
Void Est Aur – Novamente agradeço o seu interesse em realizar a entrevista e também a consideração que despendeu a este primeiro álbum da Hinarivm. Obrigado a todos. Sejam Livres!!!