Ainda desnorteado pelas duras afrontas de meu irmão ao lhe revelar que havia marcado meu primeiro encontro, como um eco suas frases coléricas gritavam em minha mente.
– Não vá.
– Que ela há de brincar com teus sentimentos.
– Que já fez antes e fará quantas vezes achar conveniente.
– Não vá a este encontro, que há de te arrepender muito, prezado irmão.
Eu fui. Ainda não havia levado a sério as duras palavras deste meu amigo, mas ao chegar ao local do encontro o vento soprou mais forte e trouxe consigo as palavras que uma pessoa clamou com o ódio de um irmão que apenas não queria me ver vendido por um preço tão baixo.
Parei. Pensei. Senti o tamanho da verdade. Doeu como nenhuma outra dor porque bateu no coração, mas lá estava eu. Refletindo, mas lá estava eu a esperar. Do fundo do que me é eterno, sabia que você tinha razão. Que eu não era correspondido. Que estava implorando por um mínimo de amor a uma pessoa incapaz de me amar, mas lá estava eu. Essa interrogação foi ficando maior e me sufocou. Essa realidade era muito perturbadora, mas era apenas a realidade socando minha aura. Fiquei envergonhado de mim mesmo ao defrontar-me com o patético papel ao qual estava prestando, mas lá estava eu a esperar naquela esquina.
Lembro-me com clareza deste episódio não porque aqui estou a assistir tudo de uma outra perspectiva no futuro, mas porque foi a coisa mais importante da minha vida. Está e estará marcada para sempre essa melancolia em minha alma.
Eu estava calado, encostado no poste, agasalhado, enfrentando o frio. Estava para chover. Era o meu primeiro encontro. Eu tinha apenas 15, era apenas uma criança. Ainda não usava drogas. Não tenho certeza se estava preparado para suportar toda esta angústia. Veja! Lá estou eu naquela esquina. Sou eu mesmo. Naquele momento lembro-me que senti medo. Era um grande vazio que me afligia. Percebi que estava de frente a uma dor sem precedentes, por isso lá estou eu voltando para casa. Também me recordo que morri por dentro neste momento, e que por dias a fio chorei a fim de expulsar esta sofreguidão de meu espírito. Nos meses seguintes estive perto de cometer suicídio por quatro vezes.
Agora tudo parece trivial, mas neste dia eu senti Satanás de uma forma muito forte. Ele veio e destruiu minhas expectativas, mas estava usando a forma de suas palavras, irmão. Mas ao menos depois que tudo havia passado, e mesmo sem que eu esquecesse, parei de olhar o mundo e passei a observá-lo. Com olhos diferentes. Distantes. Quase mortos. Até hoje um pouco desta agonia continua a consumir-me. Aquele começo de noite me foi muito especial. A energia estava faltando. Quando entrei na meia escuridão da casa respirei um ar viciado porque algumas velas já estavam acesas. Eu já pressagiava lhe encontrar em nosso quarto. Pensei ter te ouvido rindo de mim, mas fora apenas a imaginação me pregando uma peça. Quando abri a porta percebi que estava a me esperar. Uma vela. Você não disse uma palavra sequer. Apenas me abraçou e deixou-me chorar em tua companhia.
À primeira vista o que se percebe é que eu estava fugindo da vergonha, mas a verdade é que apenas estava preservando a integridade que ainda existia, e nada além. Esta é a verdade, mas somente eu sei disso. Veja! Lá estou eu fugindo. Observe… Eu sou aquele que tem medo de chorar em público. Lá estou eu passando ao lado daquela senhora, com receio que perceba a lágrima que corre meu rosto. Veja… Aquele com as mãos no bolso sou eu. Ainda não me reconhece? Veja, sou a única pessoa triste. Foi neste momento que te dei razão.
Desde então, melancólico, vivo durante o dia para contemplar o eterno azul negro do céu da noite a tocar o oceano. A cada dia mais me convenço que será aqui minha quinta oportunidade de suicídio. Vontade não me falta. Apenas estou colhendo um pouco mais de coragem para me atirar destas pedras e debater-me até onde não encontre o caminho de volta. Veja! Veja como é fantástica a influência da maré! Nestas circunstâncias terei a morte mais maravilhosa, deitado envolto do mar infinito, contemplando os mistérios da lua cheia, aguardando o momento em que as forças se acabam e que eu mergulhe inconsciente e só venha a emergir apoiado nos braços de Deus.
Por: Infragalaxia