O quão difícil era viver naquela fazenda, onde se tinha apenas plantações e animais.
Em 1934, conheci Josh. Era um rapaz mudo que vivia no sítio ao lado de onde eu trabalhava. Ele ajudava seus pais com a colheita de algodão e nos afazeres das incansáveis rotinas que se tem morando no campo.
Josh era surdo-mudo, mas tinha um brilho em seu seu olhar e um carisma inigualável a qualquer ser humano. Sempre se comunicando com as mãos, ou apontando para isso e aquilo, ele ia “dialogando” do seu jeito. Era um rapaz admirável, com dentes alinhados e brancos, pouco comum para a vida difícil nos sórdidos dias de fazenda daquele ano.
Uma vez, perguntara a Josh o que ele mais gostava de fazer. Ele me respondeu que amava dormir e sonhar, pois nos sonhos ele podia falar, escutar. Disse com suas mãos e seus métodos também que nos sonhos tinha uma linda voz grave, típica de cantores famosos que ecoavam nos rádios velhos de pilha em nossas humildes casas. Pensara eu que Josh sonhava com falar e escutar.
Ele me disse uma vez que em um de seus sonhos, ele cantarolava músicas e pedia Margareth em casamento, se ajoelhando e pegando a mão de donzela.
Margareth era uma jovem filha dos patrões das terras que aparecia de vez em quando com seus pais por ali. Sua beleza era assustadoramente invejável. A primeira vez que ela viu Josh, se encantou com o rapaz. Depois, sabendo de suas condições, ignorou ele. Fazendo com que ele se sentisse amaldiçoado por ser surdo-mudo. Josh era um sonhador, literalmente. Algumas pessoas diziam que quando estava de bom humor, era porque o simples fato de ter sonhado e conseguido falar no sonho. Todos sabiam desse caso. Ele não escondia esses sentimentos, muito menos se incomodava em dizer para as pessoas que nos sonhos ele se sentia completo. Josh chegou a tomar muitos remédios para dormir mais, assim dialogar mais. Chegou um tempo em que não se via mais ele nas plantações. Ficava quase todo o tempo em casa, deitado, se medicando com calmantes e dormindo muito.
Certa vez, seu pai indignado com essa situação, pois precisava do filho para ajudar nos afazeres, num momento de raiva disse a Josh que se fosse para viver assim era melhor ele morrer. Pelo menos, na outra vida, no outro plano ele poderia conversar já que, os sonhos são quase uma espécie de outra vida.
Josh pensou muitos dias nisso. Fixou nesse pensamento a ponto de tentar tirar sua vida algumas vezes. Seu pai, arrependido, tentou explicar que tinha sido apenas rude com ele.
Passados alguns dias não se via mais Josh em lugar nenhum. Sumira como se tivesse evaporado pelos ares.
Todos nas fazendas se mobilizaram à procura de Josh. Andando dia e noite nas florestas próximas e nas estradas de terras, perguntando a todos se viram o rapaz, especificando sua aparência.
Eis que depois de alguns dias, o patrão pai de Margareth chega às terras abatido, triste.
Diz que sua filha fora assassinada. Assassinada por Josh.
Ele a fez escrever uma carta.
“Josh vai me matar e depois cometer suicídio. Ele me convenceu que se morrermos, poderíamos viver em outro plano, ele me pediria em casamento, com sua linda voz grave que ouvia em seus sonhos. Eu tenho medo de me matar, então, aceitei que ele fizesse isso pra mim. depois ele vai fazer o mesmo. Tive a melhor impressão quando o vi, depois a pior quando soube do seu problema. Ele me convenceu, já que não existe ninguém nesse mundo que me agrade, a não ser a aparência dele.” Margareth.
Assim foi a vida de Josh, o surdo-mudo. Vivendo com Margareth em algum lugar do seu subconsciente, indo atrás de seu sonho e, pedindo com sua voz linda e grave a mão de sua amada em casamento.
Escritor, músico e entusiasta do cinema.
Como escritor, tenho 5 livros publicados, participação em diversas antologias.
Como músico, fui baixista e vocalista da banda Abuso Verbal e atualmente vocalista da banda de Metal Punk “Roto”.
No cinema, já escrevi críticas para o site Cineset, diversos fanzines como, Sindicato dos Assassinos e também divulgo análises no feed do meu instagram.