O retorno de um dos ícones do Black Metal BR, LUCIFERIANO, conhecida por sua intensa e sombria sonoridade, mergulhada nas profundezas filosóficas d ocultismo, abordando temas como a liberdade individual e a rebelião contra os dogmas religiosos, e isto tudo pode ser ouvido no seu CD Hipocrisia Angustiosa.
Conversei com o Antônio Gonçalves “Judas Iscariotes”, o mesmo nos relata a vida do LUCIFEIANO na terra, novidades e a arte marginal (old times), explorando os elementos que moldam sua música e identidade.
Confiram!
E aí amigo Antônio Gonçalves (Judas Iscariotes), sabemos do legado da horda, mas como se iniciou a trajetória do LUCIFERIANO no underground? Digo, sendo a banda formada em 1999, época em que o Black Metal era uma arte marginalizada e eram poucos os músicos, aliás, se não me falha a memória, você na época em que formou o Luciferiano tocava na horda IMPURO.
Salve, grande brother, Hioderman! … Em primeiro quero agradecer a oportunidade de estar aqui e parabenizar o magnífico trabalho feito pelo portal Lucifer Rex. Bom, na realidade, antes de formar a Impuro eu passei por outras bandas desde o final dos anos 80, tais como: Necropsia, Vomit e Virgo Sacrum, sucessivamente. Após o término da Impuro concidiu de outras bandas aqui da região (Imperum Tenebrae e Yogoth) também finalizarem suas jornadas, então procurei o Jack Camargo (ex baixista da Yogoth) e o Berkley Henrich (ex baterista da Imperum Tenebrae) para analizarem minha proposta de montar a Luciferiano, sendo que aceitaram de boas e na sequência chamamos o Geovane Poncio (Zortis) para fazer os vocais. Dá para dizer que tive sorte em ter estas figuras, até então com certas experiências dentro da cena, bem próximos de mim e com muita vontade de fazer o som rolar pois, como você mesmo coloca em sua pergunta, eram poucos os músicos de Black Metal na época. Quanto a marginalização desta arte, é claro que diminuiu bastante, isto devido à toda a mídia especializada que envolve o BM, levando os trabalhos dos artistas para pessoas que jamais pensaram em ouvir este tipo de música. Porém, na minha opinião, o status de “arte marginal” deve prevalecer porque a arte, em geral, é uma expressão de oposição aos dogmas enraizados nesta sociedade que pertencemos.
O primeiro lançamento foi a Demo Tape autointitulada, isso em 2001, esta teve uma divulgação bem ampla, aliás, lembro de uma versão CD também. Como vocês avaliam este item hoje em dia, duas décadas e meia após o lançamento?
Nesta época fiz uma proposta aos meus parceiros de banda, para que gravássemos uma demo, divulgássemos o máximo que pudéssemos e só depois disto saíssemos para tocar. O pessoal entendeu bem a proposta e mandamos ver. O resultado disto foi ótimo pois, teoricamente, fizemos o contrário da maioria das bandas da época. Iniciamos com a versão em CD para a demo, que era bem mais em conta para a gente e todas as semanas, após gravarmos, eram pilhas de CD’s que enviávamos para outras bandas, zines e etc, para que conhecessem o nosso trabalho. Logo começaram a chegar muitos convites para tocarmos em várias cidades das regiões sul e sudeste e, também, o convite para esta demo ser relançada em formato k7 pelo selo Chaos 666 Records, o que aconteceu em 2002. Da minha parte, tenho um carinho todo especial por esta demo, pois foi o início de tudo para a Luciferiano e, para muitas pessoas, foi algo impactante porque quebrava com as regras do gênero, predominada pela forma norueguesa de fazer BM. Acredito que isto foi o ponto crucial para o início da banda.
Em 2006 a banda lança o tão aclamado CD “A Face do Cão”, via Sonic Blaster (este selo ainda existe?), hoje em dia este CD é um item raro, já houve alguma proposta para relançar o CD, sendo que em 2021 já teve um relançamento, mas em versão tape via Old Evil Spirit Productions, aliás, este com uma nova capa/layout.
Então, outro convite feito à banda decorrente da divulgação e aceitação das demos nas versões CD e k7, foi para lançarmos nosso début álbum através do selo Sonic Blaster (não sei como está o selo hoje). Eu já tinha contato com o Rochesther Rodrigues (proprietário do selo e guitarrista da icônica banda Profane Creation) desde a época da Impuro, o que tornou mais fácil toda a negociação. Fizemos todo o processo de gravação no Estúdio Art Work com produção dos mestres do metal, Culver Yu e André Tulipano, ambos integrantes da Steel Warrior, uma das minhas bandas preferidas do Heavy Metal brasileiro. Logo após o lançamento deste trabalho, novamente, surgiram mais e mais convites para tocarmos em diversos lugares. Houve uma proposta do Marcelo Beherit, proprietário da Blood Black Distro, para lançar em breve A Face do Cão em formato vinil, porém, isto se encontra em fase inicial. Quanto ao relançamento do mesmo em formato k7 através da Old Evil Spirit Productions, na época, o Santiago (proprietário do selo) teve que adiar o relançamento devido à problemas de saúde na família, no qual teria que desembolsar um bom dinheiro. De qualquer forma, conforme mencionado acima, deste item ser raro atualmente, há interesse de nossa parte que venha a ser relançado.
Em 2013 uma cooperativa de selos se reuniu pra lançar o CD “O Opositor” (que aliás eu cuidei da parte gráfica/layout do CD e da prensagem, também capitaneei os selos), este era uma justa homenagem ao finado amigo Geovani “Zortis” Poncio (vocal), este CD também teve uma reedição em versão Demo Tape via Impure Metal Distro. Como se deu o processo de gravação e lançamento deste fuderoso CD?
Gravamos “O Opositor” em dois estúdios. As guitarras, baixo e vocal, foram gravados no Mug Estúdio, em Joinville – SC. A bateria foi gravada no RVB Estúdios, em Blumenau – SC. Este trabalho foi um divisor de águas pois, pelo fato de soar diferente do primeiro álbum oficial, assisti uma certa ramificação entre pessoas que gostam de Luciferiano. Uma parte venerando “A Face do Cão” e, outra parte, idolatrando “O Opositor”. Pra mim isto foi muito legal porque não tivemos interesse em fazer um disco igual ao anterior e assim tirar proveito, já que as pessoas tinham curtido muito “A Face do Cão”. Este lance da cooperativa entre selos que simultaneamente lançaram este disco, se não me engano foram 13 selos brasileiros, foi sensacional. Isto mostra a força de uma união em prol de um objetivo. Acredito que os selos ficaram tão satisfeitos quanto a Luciferiano e grande parte dos que adquiriram este álbum. Certamente foi uma baita homenagem ao Geovane Poncio (Zortis), nosso vocalista, que recém havia falecido. O relançamento de “O Opositor” em formato k7, na realidade, foi feito através de dois selos, Impure Metal Distro e Trevas Nascemos Distro, no qual recebi em mãos um lote de brinde quando fomos tocar na cidade de Birigui – SP, em 2023. Fiquei muito feliz com a consideração pelo nosso trabalho.
Aliás, vamos falar deste fuderoso CD “Hipocrisia Angustiosa” lançado 11 anos após o “O Opositor”, por qual motivo este hiato? E, comente como foi o desenvolvimento deste CD e o que podemos esperar de novidade (ou não) na sonoridade do Luciferiano.
Bom, “A Face do Cão” foi lançado em 2006, levamos 7 anos até lançar “O Opositor”, que foi em 2013, e agora, após 11 anos, estamos lançando nosso novo álbum “Hipocrisia Angustiosa”. Estes longos intervalos devem-se ao fato que a banda mudou muito as formações e nestas mudanças todas ficou muito complicado ter uma sequência de trabalho que resultasse em novos discos. Ainda hoje é difícil pensar em produção em larga escala porque ensaiamos muito pouco e nunca foi do perfil da Luciferiano “fazer qualquer coisa pra encher linguiça”, como se diz no jargão popular. Lançamos “A Face do Cão” contendo 6 músicas, “O Opositor” 6 músicas e, neste novo álbum, “Hipocrisia Angustiosa”, completamos o número místico “666” com mais 6 músicas. Este trabalho foi bem sossegado, vamos dizer assim, porque quatro das músicas já haviam sido lançadas como singles e o arranjo das outras duas já os tinha prontos há algum tempo. Agora, se o nosso segundo disco foi bem diferente do primeiro, este terceiro diversa completamente dos outros. Todas as músicas são mais diretas e objetivas, sem muitos rodeios, o que deixa o trabalho um pouco mais maduro se comparado aos anteriores. Porém, o que digo é apenas de forma técnica sendo músico integrante da banda e não como as pessoas que apreciam e analisam a mesma estando do lado de fora, pois, na real, são estas que irão “enxergar com outros olhos” relatando se o disco ficou bom ou não.
Comente o conceito criativo pra arte do Hipocrisia Angustiosa, o uso de uma IA pra gerar a imagem de capa, porque não optar por um designer/desenhista underground?
Foi algo que aconteceu muito rápido pra gente. Eu havia conversado com o Flávio Leviaethan (proprietário da True Metal Records) para sondar um interesse do selo em lançar este trabalho, no qual o mesmo aceitou, porém, nos pediu que fôssemos responsáveis pela arte e os entregasse o mais breve possível. Como tínhamos de entrar em estúdio para gravar as músicas, acertar toda a documentação e demais detalhes que envolvem selo e banda, optamos pelo uso de IA para acelerar o processo. A imagem tem um conceito relativo à faixa título, onde sua letra consta no encarte do CD. Talvez para um próximo álbum, se não for tão corrido como aconteceu agora, poderemos orçar e analisar os trabalhos de designer’s para desenvolverem uma parceria com a Luciferiano.
Como estão os shows/eventos do LUCIFERIANO pós pandemia? Já há um tour para divulgar o “Hipocrisia Angustiosa”?
Após a pandemia, conforme a rotina foi voltando ao normal, os convites vieram aos poucos e tivemos a oportunidade de fazer shows em ótimos festivais nos estados de São Paulo, Santa Catarina e Paraná. Quanto a fazer uma tour de divulgação do novo álbum, isto é muito complicado, quase que impossível, pois se for em dias sequenciais iguais as tour’s da maioria das bandas, o nosso vocalista tem apenas o dia de sábado de folga no trabalho, então ficamos restritos à shows esporádicos onde possamos fazer apenas um bate e volta.
Como está a formação atual do LUCIFERIANO, digo, já houveram várias formações, como está o processo criativo da atual? E se ainda tem contato com os ex membros da banda?
Na Luciferiano, ao longo destes 25 anos, já passaram grandes músicos, pessoas consideradas por seus trabalhos na cena BM brasileira, ao qual tenho um enorme apreço mantendo uma grande amizade e contato frequente com a maioria destes. Até por sinal, ontem (18/11/24) recebi na minha casa a visita do Berkley Henrich (primeiro baterista da banda) no qual ficamos papeando e relembrando histórias que vivenciamos no passado. Quanto a formação atual da Luciferiano, está veio se lapidando aos poucos, numa espécie de metamorfose, primeiro entrou a Bia Cunha (baixo) em 2019. Depois entrou o Willian Puchalski (vocal) em 2021 e, por último, entrou Dian Machado (bateria) em 2022. São pessoas talentosas que “aguentam o tranco” nos shows ao vivo. Isto sem dizer que a Bia Cunha é minha esposa, estamos juntos há 26 anos e, fora a vida costumeira de casal, criamos uma grande parceria de baixo e guitarra onde podemos adiantar as composições, pois temos de domingo a domingo para tocarmos juntos.
Tive a grata satisfação de também cuidar do layout do CD do APÓCRIFOS o qual você e a Bia Cunha fazem parte, além deste ainda tem o recente projeto DELÍRIO que também lançou um CD, gostariam de falar destes projetos/bandas? Aliás, quais outros projetos os atuais membros da LUCIFERIANO também participam?
Cara. Apócrifos e Delírio são experiências sensacionais na minha vida. Montamos a Apócrifos num período que a Luciferiano estava em pausa, bem comum à todas as bandas. Eu e a Bia nos juntamos ao Culver Yu (baterista da Steel Warrior), justamente quem produziu “A Face do Cão”, e ao Victor Moura, vocalista/barítono, talento nato. Haviam arranjos de guitarras e baixos que tínhamos guardado para soltar na Luciferiano, mas como precisávamos de composições na Apócrifos para mostrar ao público, apresentei ao projeto e o pessoal curtiu. Fomos lançando música por música e logo apareceram selos que gostaram e lançaram a gente. Fizemos ótimos shows e a repercussão até hoje é muito boa. Então veio a pandemia e não podíamos ensaiar e muito menos sair pra tocar com as duas bandas. Neste momento eu e a Bia tivemos a ideia de montar a Delírio, um projeto voltado às catástrofes que assistíamos no dia a dia. Começamos a gravar e lançar através das redes as nossas composições, foi aí que também apareceram selos que se interessaram e lançaram este projeto. Começamos em duo (guitara/vocal e baixo com bateria gravada) e logo após entrou na batera o multi-instrumentista e produtor musical, Kelwin Grochowicz, que foi o produtor da Apócrifos. Fizemos shows em ótimos festivais com boa repercussão na cena. O Kelwin acabou saindo devido aos compromissos com seu estúdio e retornamos a ser um duo. O nosso vocalista, da Luciferiano, Willian Puchalski, faz vocal na Diabolical Funeral, excelente banda de BM de Joinville – SC, e também faz parte da Doom Castle. Já o nosso baterista, Dian Machado, toca também na Shadowings, ótima banda de Heavy/Power Metal também de Joinville – SC.
Olhando para a cena atual comparada a antiga fase de eventos em locais não tão propícios ou com condições para a realização de um evento, bom, falo de bares locais com pouca estrutura…, quais as avaliações atuais você acha necessário para a realização de um bom evento pro LUCIFERIANO?
Luciferiano não tem frescura, tocamos para quem quer nos assistir, independente se é um festival para 2.000 pessoas ou tocar num pequeno bar para 15 pessoas, o prazer é o mesmo, é o espírito underground. Temos os pés no chão quanto a isto, sabemos que os nossos trabalhos formais são mais rentáveis para a nossa sobrevivência do que ganhamos tocando e entendemos também que não iremos ganhar dinheiro com a Luciferiano ao ponto de sobrevivermos exclusivamente da banda. Então, o que pedimos sempre é o básico, ou seja, passagens, estadia, alimentação, bebidas e um cachê simbólico.
Para este 2025, o que podemos esperar do LUCIFERIANO, quais eventos/projetos engatilhados?
Então, estávamos escalados para tocar no início de 2025 em 2 ou 3 festivais (não me lembro corretamente) que iriam ser produzidos pela Necrovoid, no qual iriam trazer uma banda gringa como headliner. Aconteceu todo aquele rolo lamentável com a produtora e os festivais foram cancelados, aliás, não dá pra dizer nem que foram cancelados porque não havia divulgação alguma formalizada, as negociações ainda estavam em off. No mais, para 2025, iremos aguardar os convites para negociarmos e podermos fazer nossos shows.
E sobre o documentário de 25 anos da LUCIFERIANO, como está o andamento?
Este foi outro lance que deu “tilt”. Quando o proprietário da produtora veio me procurar oferecendo a gravação de um documentário referente aos 25 anos da Luciferiano, fiquei muito animado com toda a ideia, dei permissão para que produtora pudesse começar a colher depoimentos etc, avisei aos integrantes da banda que faziam parte na época e todos ficaram também eufóricos. Aconteceu que uns tempos após, com as gravações já iniciadas, conversei mais a fundo com o produtor e o mesmo me avisou que este documentário seria financiado através de verba pública, que iria render uma boa grana tanto para a produtora quanto para a banda. Então de imediato eu pedi o cancelamento, comuniquei aos meus parceiros justificando o motivo e eles entenderam. Não curto esta ideia de dinheiro público financiando bandas e/ou artistas que sabem andar com suas próprias pernas.
Agradeço imensamente o tempo cedido, deixo este espaço para algo mais que queiram complementar.
Meu brother, Hioderman. Mais uma vez lhe agradeço pela oportunidade de estar aqui neste espaço tão importante da cena brasileira, o portal Lucifer Rex, para descrever um pouco a trajetória da Luciferiano e, em alguns momentos, me deixou à vontade para comentar sobre os meus projetos pessoais. Lhe desejo muito sucesso neste seu caminho que já é vitorioso e espero que tanto você quanto aos apreciadores da Luciferiano curta o nosso novo trabalho. Grande abraço!
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