A banda britânica My Dying Bride lançou no dia 19 de abril de 2024 o seu décimo quinto álbum de estúdio – ou décimo quarto se considerarmos que o álbum lançado em 2011 “Evinta” é na verdade um álbum comemorativo com faixas orquestrais remixadas. “A Mortal Binding” é o segundo lançamento da banda pela Nuclear Blast, depois de muitos anos de parceria com a Peaceville, gravadora que lançou a banda, assim como seus conterrâneos Paradise Lost e Anathema, bandas que formaram o trio que impulsionou a onda do “Death-Gothic-Doom Metal” dos anos 90. Se o Anathema optou por seguir um direcionamento musical diverso e o Paradise Lost, depois de anos experimentando com o eletrônico e o Rock Gótico, voltou à sua sonoridade clássica, o My Dying Bride manteve-se firme em seu direcionamento “Death-Gothic-Doom”, tendo lançado apenas um único trabalho experimental nos anos 90 (o controverso “34.788%… Complete” de 1998). “A Mortal Binding” é um álbum que não decepcionará aqueles que preferem seus dois primeiros trabalhos e muito menos aqueles que apreciam toda a discografia da banda. Um trabalho denso, pesado, melancólico, grandioso e belo como é característico do quinteto.
O álbum abre com “Her Dominion”, uma faixa que logo apresenta a proposta da banda nesse trabalho: peso, densidade e dramaticidade, indo direto ao ponto, sem as experimentações e adereços presentes no último álbum, o excelente “The Ghost of Orion” de 2020. Embora o álbum anterior de 2020 seja belo e um dos melhores lançados naquele ano, ao optar dessa vez por uma abordagem mais direta, o grupo não apenas evita se perder ao se repetir, mas também evita exagerar em passagens sinfônicas e experimentais que frequentemente comprometem bons trabalhos (os últimos álbuns do Rotting Christ são exemplos disso). “A Mortal Binding” sustenta-se apenas com aquilo que é o essencial do My Dying Bride: os riffs pesados e marcantes de Andrew Craighan, não desprovidos de belas linhas melódicas; a cozinha rítmica densa de Lena Abé, cujo baixo dessa vez foi colocado em plena evidência, acompanhada pela guitarra rítmica do estreante Neil Blanchett e da bateria do regressado Dan Mullins; e não poderiam faltar os teclados e violinos de Shaun MacGowan, colocados aqui no ponto certo; e claro, os versos poéticos e as diversas vozes de Aaron Stainthorpe.
Enfim, um trabalho irrepreensível composto por 7 faixas, 54 minutos e 53 segundos de uma viagem sonora lúgubre, densa e melancólica, ainda que ao mesmo tempo, paradoxalmente, raivosa e angustiante. A primeira faixa, a já mencionada “Her Dominion”, narra o engendramento cosmogônico do caos original por meio do vocal gultural de Aaron Stainthorpe, cujos versos são ainda mais pesados e dilacerantes que sua voz: “Her throat labours at the work of felate”. O início explícito é apenas a preliminar para o que daí se segue: “Bride of the rotting world, made by God / Awful and beautiful to her eyes / Because here, here love ends, here love dies / Come the arrival of the God of all flies”. O parto trágico e dolorido pelo qual a mãe de toda a humanidade é levada à sua própria crucificação nos portais do inferno é também aquele pelo qual toda a existência vem a ser.
Mais melodiosa e melancólica, a segunda faixa, “Thornwyck Hymn” foi o primeiro single lançado em formato de clipe em fevereiro deste ano. A faixa seguinte, “The 2nd of Three Bells”, foi o segundo single, lançado no formato de vídeo em março. Essa faixa se destaca como uma das melhores do álbum, com suas alternâncias entre belas melodias e passagens brutais, além das diversas vozes de Aaron. Também vale destacar a quarta faixa, “Unthroned Creed”, a qual contém uma pausa dramática que faz um perfeito contraponto à densidade dramática de toda a obra. Os versos “There are young women here filled with beautiful blood / In a world as cold as death, I lay within the flood” são apenas lidos por Aaron como “spoken words”, uma de suas facetas mais marcantes.
A quinta faixa, “The Apocalyptist”, tem sido bastante apontada como a melhor do disco. Longa, pesada e fúnebre, uma típica faixa do My Dying Bride, uma preferida dos mais saudosistas, por relembrar as mais longas faixas de álbuns dos anos 90 como “Turning Loses The Swans” e “The Light at the End of the World”. As duas últimas faixas, “A Starving Heart” e “Crushed Embers”, embora sejam boas, talvez não tenham a mesma força das cinco primeiras. O encerramento abrupto de “Crushed Embers” deixa o ouvinte ao mesmo tempo perdido e angustiado, afinal, com a noiva moribunda o final não poderia ser feliz…
Por falar em infelicidade, mesmo tendo divulgado bastante o novo álbum – Andrew Craighan chegou a dar muitas entrevistas a diversos meios e até a pequenos canais do YouTube, e mesmo com o aplauso da crítica especializada, a banda anunciou sua desistência em participar do Maryland Deathfest, um dos maiores festivais de metal dos Estados Unidos. Posteriormente, a banda lançou um comunicado em seu perfil oficial do Instagram afirmando que após a gravação do novo álbum a banda se encontra em tal estado de esgotamento que preferiu suspender todas as apresentações previstas para 2024. Espera-se que a banda se recupere, supere seus problemas internos e possa em breve apresentar ao vivo parte do material desse novo grande álbum.
Nota 9/10.