Desde que nasci eu vivo numa das maiores metrópoles do país, Salvador, terra onde inspira-se aquelas ideias que o calor do verão enseja: luxúria, mar, pouca roupa e muita, mas muita sensualidade, principalmente através dos olhos da mídia, que incessantemente faz a publicidade dessa cultura corporal vicejar aos quatro cantos do mundo.
Ter a pele bronzeada, naturalmente também se transforma nesse arquétipo de beleza sensual, graças também ao aspecto miscigenado em que vivemos, um país em que se formou a partir de várias matrizes diferentes. Não obstante nos vemos em paradoxos que as redes sociais podem amplificar como, mulheres e homens que exibem sua exuberância corporal de forma lasciva em fotos ou vídeos com danças eróticas que simulam coitos efetivos em movimentos intensos e frenéticos com a pélvis, pernas, braços, ombros… talvez aos olhos dos puritanos uma afronta moral. Quiçá dentro das próprias cabeças dessas pessoas passe também a ideia de que alguma fronteira moral esteja sendo violada com aquela maneira de se expressar corporalmente.
O que há de fato é uma não muito ortodoxa forma de exibir corpos e não mais em câmaras secretas com replicação de fotos limitadas e restritas as alcovas dos poderosos endinheirados que podiam pagar por elas no início do século vinte, até por volta dos anos oitenta do mesmo século. É certo que o século vinte e um nos mostrou outros tipos de exibição corporal que extrapolasse nossos deleites mais insanos, nossa imaginação se tornou um fato digital, aparentemente concreto. Do outro lado, entra então o contraditório, quando muitas dessas pessoas que se exibem diariamente demonstram algum recato quando se há uma visão sobre a nudez propriamente dita. Sempre me pergunto o que um tecido colorido aderente ao corpo à ponto de o desenhá-lo traço por traço, curva por curva, pode diferir de um corpo desnudo? Será que a tonalidade? Ou melhor questionando: a cor da roupa em detrimento da cor da pele natural?
Estou passando por esse abismo de rude pensamento que em nada tem de transgressor ao passo que necessitei dos trabalhos de uma dessas pessoas que se exibem fortuitamente nas telas das redes sociais, aparentando pouco ou nenhum pudor, para um trabalho que envolvesse o nu artístico, isso pagando cachê, dando um tratamento profissional e não, essas fotos não seriam exibidas explicitamente nas redes sociais e pasmem, nenhuma das abordadas aceitou o trabalho, então o pudor apareceu, ele existe desde que não macule ou viole meus preceitos familiares, sociais, religiosos… será? Ainda tenho grande dificuldade para entender estes comportamentos, mesmo porque é bem difícil para um homem que foi criado dentro de uma estrutura heteronormativa se pôr no lugar de uma mulher, mesmo que esse mesmo compreenda as reivindicações do gênero, seus embates, seus discursos etc. todo esse comportamento não parece seguir um tramite de coerência capaz de convencer-me sobre.
A contra-cultura se mostrou um espaço de rebeldia em que muitas ações se desgastam a medida em que os anos se passam, percebemos que tudo é muito igual, seja aqui ou fora daqui, seja na minha metrópole ou naquela cidade de dois quarteirões, as transformações não são tão aparentes quanto imaginamos, os fatos são mais ardis que a calmaria que transparece, principalmente no mundo da fantasia ensejado pela mídia das redes sociais… o ser humano descolado de sua capa da pureza está longe de abandoná-la pois estamos presos no julgamento alheio, ainda que nossos desejos mais íntimos nos levem ao confronto, ainda estamos muito, mas muito mesmo, distantes de romper com essas barreiras que nos atormenta.
O pudor dos trópicos
As contradições do exibicionismo lascivo