Thrash Metal parte 18

O som que sai das catacumbas e a ascensão de um novo estilo, macabro, sombrio, das terras do cemitério.

Dark Reflections

Não me canso de sentir algum orgulho de escrever esses artigos, cada vez que eu me debruço sobre toda essa história, os fatos, as memórias, os depoimentos eu fico cada vez mais imerso nesse universo das raízes do Metal Extremo, afinal, é o tipo de metal que mais me entorpeceu por toda minha existência, principalmente aqueles que, em sua poética, abordavam temas ligados ao Satanismo e ao Ocultismo, isso sempre foi um ponto crucial na apreensão do meu gosto pessoal sobre as bandas, primeiro mesmo que o som… ou seja, eu me interessava primeiro pelo tema e a música podia vir.

Provavelmente, a maioria das pessoas na minha época de adolescente, se sentiam atraídas pela identidade visual da banda e essa tinha de ser muito bem trabalhada, as capas, as fotos … isso, quase sempre, era determinante para comprar um disco, por exemplo. Nem todas as lojas tinham toca discos para que nós pudéssemos conhecer a música e o tiro era no escuro, então, simbolicamente, o trabalho feito pela banda sobre as capas dos discos e suas fotos de formação eram muito impactantes e isso poderia significar que o som também tinha aquele mesmo ar sedutor que estava estampado em sua capa. Outra característica que sempre valorizei muito nas bandas de Metal era inserir a arte plástica na sua estética e poética como gênero imanente da obra, um corpo que não era estranho e sim um componente integrante da obra como um todo que reunia toda aquela “mística” sobre a arte sonora impregnada naquela materialização que era o LP (obviamente que estou me referindo a época em que o objeto final magnânimo do Metal era lançar LPs prioritariamente, mesmo que hoje existam variados formatos o LP ainda representa para mim um “fetiche”, um feitiço, uma magia inquebrantável que dá corpo, dá volume a cultura construída pelo universo do Heavy Metal).

Essa coisa da identidade visual, para mim, foi extensiva mais tarde para outros elementos utilizados pelas produtoras e as próprias bandas em seus materiais promocionais publicitários como flyers, banners e releases, eram fatores também chamarizes para que o “público” como eu pudesse se familiarizar com aquela banda e sentisse a necessidade de se aproximar do seu “produto” final que era a música. A liberdade de discurso que o Metal me apresentou, assim como o conhecimento que fui adquirindo no decorrer do tempo, principalmente com minhas experiencias artísticas, davam conta que o Metal era o espaço mais apropriado para minha mente se desenvolver, tanto no quesito intelectual, quanto na expressão artística e foi através do Metal que pude encontrar todas as minhas inteligências e assim utilizá-las mundo a fora.

Tudo isso serve para eu dizer que o Metal Extremo tem a chave de muitas portas, basta cada um saber onde estas chaves estão, ao mesmo tempo, hoje eu tenho a possibilidade de não precisar entregar chaves, mas abrir as portas e janelas para um conhecimento que eu não tive quando comecei, como disse, era tudo muito no escuro, as cegas, aprendendo, errando,  encontrando pérolas ou extraindo lixo de suas latas após remexer tudo que estava por cima encobrindo aquele mau cheiro.

As gerações dessa época, nunca terão a chance de saber como foi viver o Metal nos anos 80 ou 90 e também não precisa, “daqui pra frente é só pra trás” …, é só um trocadilho infame! A verdade é que quatro décadas foram suficientes para fazer com que o Metal fosse um estilo musical marginal, crítico, libertino e libertador, mesmo com todas as polemicas, crises e indisposições, o Metal foi um espaço de encontro com diversos conhecimentos, milhares de culturas diferentes e enriquecedoras que nenhuma rede social teria a capacidade de aprisionar as mentes mais frágeis! não, o Metal não aprisionou mentes fracas, libertou mentes poderosas, geniais que conseguiram agregar valor criativo a uma condição que, ao mesmo tempo que pode ser atraente, pode ser repulsivo, Metal nunca se colocou a disposição das massas e sim de nichos, de minorias… essa fala tem suas complexidades que perpassam por conhecimentos muito mais profundos que dão conta de uma serie de problemáticas ligadas as construções de sociedade e da antropografia, longe de ser algo simplesmente desvendado através de um artigo de opinião e sim por meio de longas reflexões a partir destas provocações.

Eis-me aqui, na décima oitava parte desta saga sobre o Thrash Metal que eu acredito ser inédita, quero crer que sim e se estiver errado que surja alguém que me corrija e apresente algum documento que dê conta desta incursão com tamanha profundidade, com essa reunião de dados, de relatos, de depoimentos, de memórias, de citações e, ademais, não posso me furtar de abraçar a soberba e rir junto com ela. É sobre o sentir, sobre o existir que devemos nos orgulhar também daquilo que está sempre em estágio de reprovação social como a soberba nos permite, sermos objeto do desprezo ou da inveja de alguém ou será que estes sentimentos são nobres quando não em nós?

Thrash Metal foi o estilo responsável por tornar o Metal um estilo musical cheio de diversidade, um verdadeiro universo de possibilidades que desse ao público algum poder de escolha sem abandoná-lo, inclusive odiar seus criadores. Conheço alguns amantes do Death Metal que não gostam de Possessed por exemplo, eu comparo essa possibilidade a dizer ser satanista, mas odiar o Diabo, tem como compreender isso? Eu não tenho essa capacidade, é uma devastadora contradição para mim, porém, ao mesmo tempo é possível, tão possível que é real e não creio que seja tão exceção assim! Sintam-se livres para fazer a escolha, pois o Metal é libertador e a vontade deve ser a essência de cada um: “Faz o que tu queres…”

Na parte anterior (parte 17), falei muito das bandas que começaram sua incursão sobre uma mistura que daria muito certo: Thrash e Death Metal. Eu diria que isso começou com Hellhammer/Celtic Frost e se estendeu para Possessed, não diria que Mantas/Death teria tantas células do Thrash Metal em suas músicas, mas Possessed sim, Possessed foi uma banda que deu grandes lições sobre brutalizar seu som com tamanha maestria que se tornou a escola perfeita para quem viesse depois. Tenho muitas convicções que uma das maiores bandas de Thrash/Death Metal dos anos 1980 teria sido uma banda italiana chamada Necrodeath, que reuniria os principais tons que dariam personalidade a mistura. Necrodeath foi uma banda que pesou a mão em utilizar a bateria bestial que o Possessed estava fazendo, aliando a musicalidade do Speed Thrash alemão e uma dose cavalar de originalidade.

Em fato, Necrodeath acabou sendo uma banda que não ganhou tão grande notoriedade na cena mundial, quem sabe a sua localização geográfica fora do centro onde o metal naquela época tinham holofotes voltados, claro que Inglaterra e Alemanha eram o centro dos olhos do mundo para a Europa do Metal Extremo naquele instante, aliás, os países latinos, como a Italia não tinham tanto destaque assim, mas acho que o Necrodeath começou a colocar o país no mapa das bandas extremas junto com outra banda muito macabra, chamada Mortuary Drape (1996).

Necrodeath foi formado no ano de 1995 numa cidade chamada Ligúria e teria sido uma das primeiras bandas de Metal da Itália, se não uma das pioneiras em se tratando de Metal Extremo. É claro, e isso fica muito evidente no som do Necrodeath que suas influencias eram Sodom, Kreator, Destruction, Venom, Possessed, Bathory e Hellhammer/Celtic Frost, mas quem não era aquela altura fazendo aquele tipo de som? É bem verdade que a banda surgiu mesmo com outro nome um ano antes de mudar para Necrodeath, antes chamou-se Ghostrider.

Como Necrodeath propriamente dito se formou com Claudio (guitarra) e Peso (bateria), Ingo (vocal) e Paolo (baixo). Essa formação gravou a primeira demo da banda que foi lançada no mesmo ano de formação oficial da banda e se chamou “The Shining Pentagram” contendo quatro músicas. Só pelo título da demo já dá para entendermos sobre o que o Necrodeath vai versar e isso diz muito sobre as influências das bandas que citei acima, afinal, aquelas bandas enveredavam pelos mesmos caminhos ritualísticos que o Venom inaugurou. Nunca é demais recordar que as subdivisões do Metal nos anos de 1980 eram muito confusas e não estava muito bem estabelecida, inclusive no que tange o Black Metal, o metal extremo estava sentenciado em dois estilos primordiais que era o Thrash e o Death, muitas bandas misturavam as duas vertentes, outras incluíam o Speed Metal ou mesmo as células do NWOBHM, neste caso, essa incursão aparece mais claro nas bandas de Thrash Metal e muito pouco nas de Death Metal…

“The Shining Pentagram” foi um grande cartão de visitas para o Necrodeath e foi através dessa demo que a banda conseguiu conquistar um número significativo de admiradores levano-os, algum tempo depois conseguir seu contrato de lançamento do primeiro e magnífico álbum “Into the Msacabre” 1987 (Nightmare Productions – gravadora da mesma cidade da banda que não tinha muita expressão). Esse álbum chamou muita atenção, mesmo porque aquilo que estava sendo feito pelo Necrodeath era muito novo e ao mesmo tempo furioso e primitivo, selvagem unido com uma temática obscura, sombria e devastadora. A gravação não é das melhores coisas que se podia ouvir e compreender na época, aliás era algo muito mais comum que exceção, as gravações de Metal naquela época eram muito sofríveis.

Você deve estar se perguntando por que trato o Necrodeath com tanta reverencia se na Itália já existia o Bulldozer, que inclusive é mais antigo? Ora, Bulldozer não se acentuou nas doses de violência sonora que o Necrodeath conseguiu, essa banda nos iniciou no que poderíamos chamar de proto-blast, “ah tá!”, mas o Sarcófago também! Não senhores, Sarcófago já era o Balstbeat, já estava consolidado na música da banda quando o “I.N.R.I” foi lançado em 1987… ok! Mesmo ano em que o Necrodeath lançou seu álbum também, vamos então incursionar sobre outras diretrizes que nos remeterão a essas influências e essas necessidades de tocar rápido ou não necessariamente rápido, mas brutal e pesado, foi isso que moveu muitas bandas da segunda metade da década de 1980.

Obviamente, Bulldozer ainda será mencionado aqui na série, porém necessita de um pouco mais de espaço e elementos que enriqueçam o discurso e, quando falei especificamente de Necrodeath e Mortuary Drape, estava me referindo especificamente a estas bandas que foram por caminhos mais recônditos do Metal Extremo, enquanto outras como Bulldozer na Itália e Vulcano no Brasil estavam construindo carreiras sólidas e muito particulares. Não exime, nenhuma delas de pertencerem a esse universo extremo inaugurado pelo Thrash Metal, pelo contrário, estão totalmente imersas nestes contextos, porém as enxergo com um olhar a parte, que não julgo simples de abordar.

O primeiro álbum do Necrodeath foi um material que chamou muito a atenção da crítica e fez com que aquela quantidade de pessoas interessadas em sua música se multiplicasse rapidamente, dando espaço para que a banda conseguisse ter uma solidez em seu início de carreira. Claro que devemos nos ater a críticas como essa: “Oito faixas foram mais que suficientes para destruir tudo o que havia de violento na Itália da época. Se Bulldozer era mais influenciado pelo Motörhead e Schizo um pouco mais voltado para death/thrash, Necrodeath realmente trouxe algo incomparável em pura obscuridade e devastação. O que podemos encontrar aqui é o exemplo mais representativo do extremismo na Itália durante os anos 80, na minha opinião. Eles foram influenciados por tudo que era extremo da época e principalmente por Slayer, Kreator, Bathory e Venom. Essa mistura letal de estilos extremos colide perfeitamente com a típica atmosfera oculta das bandas italianas daquele período e não há nada que você possa fazer antes de ser aniquilado por batidas furiosas de proto-blast, gritos negros e riffs de guitarra massivos.”, que dão vazão para o que meu raciocino enseja, algo realmente diferente do que bandas do mesmo país vinham fazendo.

Sim, eu acredito que no que podemos imaginar no cenário Italiano daquele momento, ninguém ousou tanto quanto Necrodeath, que levou a mistura dos estilos extremos a níveis muito inusitados, agregando valores que até então os limites eram pouco possíveis de serem concretizados. E continua nesta mesma crítica supracitada: “Em 33 minutos Necrodeath lançou as bases para uma nova forma de metal. Foi necessário que tocassem 33 minutos para dar algo novo, fresco e original a um panorama em constante mudança. As poucas pérolas que tínhamos no nosso underground italiano fizeram história e a mesma pergunta, talvez estúpida ou chata, passa incessantemente pela minha cabeça: E se eles tivessem nascido em outro país…?”, é sobre o “Into the Macabre” que devemos flutuar nossas ideias do que seria o Metal Extremo dali para frente.

Seu segundo álbum vem logo no ano de 1989, “Fragments of Insanity” (Metalmaster Records) já é um álbum um tanto quanto diferente do primeiro e acho que eles mudam um pouco o perfil sanguinolento do álbum anterior, dois anos depois de ter lançado um master Piece, Necrodeath mostra mais preocupação musical que ideológica, eu separaria facilmente o primeiro álbum deles do segundo. Ainda que seja possível perceber um tendencia maior para o Thrash Metal, o Death ainda está lá quiçá para elementos que seriam largamente explorados pelo estilo Black Metal mais tarde e, nesse quesito, consigo enxergar o Necrodeath mais uma vez como pioneira. A banda também havia mudado de gravadora, provavelmente uma gravadora maior e que colocaria a banda num círculo que poderia lhe render mais visibilidade, mesmo porque mudar assim de poética não foi uma exclusividade do Necrodeath, e sim a maioria das bandas dessa mesma época.

A critica não viu diferente: “Dois anos depois da estreia, que se tornou cult na cena underground, Necrodeath está de volta com um novo longa-metragem. Este é caracterizado por um impacto mais thrash que o primeiro. A produção é muito boa, sempre bastante crua como deveria ser para a época e para o death/thrash deles… sim, death/thrash porque nesse álbum o sentimento negro desapareceu um pouco… vamos deixar isso claro, eu adoro esse álbum e objetivamente é muito bom, mas falta alguma coisa na atmosfera…

As músicas são mais complexas, sempre com ótimos riffs de thrash e um ótimo trabalho de bateria, nada a dizer. Ingo nos vocais está ótimo como sempre, influenciado pelo death/thrash precoce e uma grande influência para o black metal. O título, “Fragments Of Insanity”, está bem refletido na música, pois você pode sentir loucura, desespero e ódio nessas músicas: riffs esquizofrênicos, vocais loucos e bateria violenta.” – essa crítica foi encontrada através do portal Metal-archives através da página da própria banda realizada por alguém cujo pseudo é Chrsiti_ns_anity, pseudo esse apropriado da música da banda Grave constante em seu álbum “…You’Il Never See”

Foi justamente nesse segundo álbum que, na minha percepção encerra a incursão do Necrodeath na considerada mistura entre o Death e o Thrash Metal, mesmo porque a banda encerra esse ciclo logo depois de lançar o segundo álbum ficando um hiato de nove anos, quando Claudio e Peso resolvem retornar com a banda de novos integrantes, mantendo a existência da Necrodeath até os dias atuais com um estilo que foi chamado por eles “challenging, eclectic heavy metal”, algo como Heavy Metal desafiador e eclético… desde então onze álbuns foram lançados os quais não saberia dizer visto que foi uma retomada de carreira que não acompanhei.

A próxima banda que quero aqui trazer, não podia deixar de ser a magnifica Messiah, banda que tive grande influencia pessoal e que marcou muito uma época da minha vida, portanto seria uma daquelas bandas que possuo afetividade e memória, para além de uma análise mais fria e distante. Messiah vem simplesmente de uma terra que tem muito histórico interessante para as artes e também para o Metal, sim pois foi da Suiça que pudemos ter contato com o Celtic Frost/Hellhammer e diria que isso repercute diretamente no Messiah, esse frenesi criativo fica muito evidente no primeiro álbum da banda “Hymn to Abramelim” 1986 (Chainsaw Murder Records).

A primeira demo da banda foi lançada em 1985, sob o título: “Powertrash” e continha nove músicas divididas em dois lados da fita K7, sendo que cada lado levava um subtítulo: lado A Metal e lado B Hardcore. Através dessa rápida análise podemos compreender que as células que criaram ou melhor, deram base para a criação do estilo Thrash Metal estavam ativas ali naquela demo inicial do Messiah. Algo curioso na carreira deles seria a trajetória de ir inserindo novas possibilidades no seu som o que teria aparecido, definitivamente, no seu álbum de estreia. O que não deixou de ser experimento em suas demos, é claro!

Ainda em 1985 é lançada sua segunda demo, com menos canções que a primeira e já indicando o que viria a ser gravado em “Hymns to Abramelim” em faixas como a faixa título do álbum e a faixa “Messiah”, um verdadeiro hino que, não há como não relacionar a música a banda. Mas vamos diretamente a este petardo da história do Metal Mundial e ficou ressoando durante anos algo que pudesse superar a criatividade e inspiração que os músicos da banda tiveram para criar a atmosfera de “Hymns to Abramelim”. Ele reúne basicamente tudo que vai ser muito explorado e avnaçado nas décadas seguintes: selvageria, ousadia, vocais muito rasgados e com variações rítmicas muito ricas, gritos de horror, de agonia e guitarras intensas… algo que considero novo também foi o que eles fizeram em faixas como “Space Invaders” que qualquer pessoa com alguma boa memória musical vai conseguir, com alguma facilidade, perceber de onde o Samael tirou inspiração para criar sua atmosfera, seu estilo de Black Metal arrastado, pois o Messiah fez isso no seu álbum de estreia simplesmente em 1986.

Tudo em “Space Invaders”, morbidez, composição, arranjos, nos leva a um estilo musical que foi sendo moldado um pouco mais a frente e eu posso colocar os méritos no Messiah sem medo de cometer algum equívoco. Estava muito claro, na minha percepção, que Messiah estava, assim como o Necrodeath, inaugurando possibilidades ímpares de fazer Metal Extremo e colocando cargas de energia negativa em suas músicas, ainda que suas letras não fossem capazes de traduzir esse sentimento plenamente, que as duas coisas não se unissem ou até não combinassem.

Messiah ainda teria o segundo álbum, provavelmente o mais conhecido deles, lançado no ano seguinte ao primeiro, 1987. “Extreme Cold Weather” (Chainsaw Murder Records) já era um álbum mais complexo e menos descompromissado ou ousado que o anterior, mostra a banda em busca de um som mais técnico e não tão espontâneo quanto pareceu ser o “Hymns…” ademais, ali também estava sendo incrementado um padrão na banda que deveria corresponder melhor ao “mercado” musical do Metal naquele instante, principalmente se consideramos que a banda está alçando novos voos e isso poderia significar mais “seriedade” em suas produções, imediatamente refletidas em seu jeito de compor. Apesar desta percepção, a essência da banda ainda continua muito viva em seu segundo álbum, ainda assim o que Tschösi faz com sua voz nesse disco, já não é tão experimental assim como foi antes e isso significa que o vocalista tenta algo que ficou mais conhecido como amadurecimento, mas eu classifico como polidez vocal, sendo mais econômico nos berros, nos agudos e mesmo nas incursões insanas de vocalizes menos compromissados com a métrica musical.

A primeira formação do Messiah contou com Brögi Guitarra, Jazzi Bateria/Bass e Tschösi Vocal, para as dinâmicas ao vivo, Tschösi assume o baixo além do vocal e isso também repercute para as próximas gravações, sobretudo nos álbuns. Estes lançamentos lhe renderam assinar com uma grande gravadora, a alemã Noise e depois disso Messiah vai lançar álbuns muito mais dentro do universo do Death Metal que propriamente do Thrash, perdendo sutilmente essa característica, mesmo porque os anos 90 essas divisões e definições de estrutura musical começaram a ficar muito bem definidas e distintas.

“Choir of Horror” foi lançado em 1991 e não contava mais com o vocal e baixo de Tschösi, aqui já temos a presença de Andy Kaina, mudando verticalmente o estilo de voz que a banda fincou nos dois primeiros álbuns, além de novo baixista e novo baterista Patrick Hersche e Steve Karrer respectivamente, restando apenas Brögi como membro original da banda. Certamente que contar essa história, enquadra o Messiah muito mais dentro da cena Death Metal a partir de então, contemplando aqui um divisor de águas muito bem estabelecido entre antes e depois do “Extreme Cold Weather”.

Mundialmente “Extreme Cold Weather” foi o álbum mais conhecido da banda, já aqui no Brasil eu diria que foi o “Rotten Perish” 1992 (Noise Records) quarto álbum de estúdio e que foi lançado por aqui ainda nos anos 1990, num momento em que o Death Metal estava sendo lançado por aqui aos lotes, através da gravadora Rock Brigade Records no ano de 1994. Acredito que tenha deixado evidente que a fase que considero o Messiah como pioneiro do Death/Thrash Metal tenha sido até o lançamento do seu segundo álbum e, a partir daí tudo já vai ganhando novas configurações que destoam um pouco do que teria sido a ideia inicial da banda.

Quero mais uma vez voltar os olhares para a porção latina da Europa e, dessa vez, para a França tentando falar de duas bandas que também foram parte desse embrião de mescla entre Thrash e Death Metal, trata-se de Massacra e Agressor. Massacra é uma banda gringa que me faz lembrar demais das bandas brasileiras da mesma época, lembra por exemplo o Expulser, que tinha uma sonoridade em sua completude muito parecida com o Massacra, aliás as bandas de Minas Gerais também trabalharam muito bem essa mescla entre Death e Thrash Metal, então citar Massacra seria trazer a pauta um olhar sensível ao trabalho feito por essas bandas brasileiras como o Expulser.

Massacra iniciou sua carreira em 1986 como um quinteto, mas logo foi se moldado a um trio e chegou a gravar sua primeira demo em 1987 “Legion of Torture” contendo cinco músicas e em sua formação Jean-Marc Trisani guitarra, Pascal Jürgensen baixo e vocal e Frederick Duval bateria. Logo o baterista Duval sai da banda para morar nos Estados Unidos e força a banda a recrutar novo memobro, Chris Palengat. De nova formação, no ano seguinte, Massacra grava sua segunda demo “Final Holocaust” depois disso Duval retorna a banda, só que desta vez assume outra guitarra e a banda passa a ser um quarteto.

Mais uma nova formação e o Massacra grava sua terceira demo em 1989: “Nearer from Death”, contendo três músicas e um material matador para estrear no mundo do Metal Extremo através de seu primeiro álbum “Final Holocaust” título já usado na sua segunda demo, outro aspecto importante desse material é o rumo da sonoridade que a banda vai assumir, muito mais voltado para a mescla com o Death Metal, aliás ensejando muito mais Death e soando pouco próximo do Thrash Metal, apesar dessa característica estar muito presente nesse material. Massacra vai fazer parte desse grupo de bandas europeias que vão trabalhar muito nesse campo de mistura de estilos extremos passeando muito bem entre esses dois universos que se contaminaram, não há como detectar “pureza” sonora nestas bandas, já que tinha muita intervenção dos estilos em evidencia: Speed, NWOBHM e o Thrash, já o Death Metal era um experimento muito recente, que ainda não havia se firmado e estava muito mais próximo de músicos muito jovens e inexperientes.

Massacra foi uma banda de relativo sucesso no final dos anos 1980 transitando para o 1990, seu contrato com a Shark Records parecia estar dando certo e outro álbum foi lançado “Enjoy the Violence” 1991, porém a aparência enganou muita gente, inclusive os músicos do Massacra que logo saíram do selo e buscaram outro que desse suporte aos seus projetos dentro do Death/Thrash que eles estavam trabalhando, aliás, uma das principais bandas do gênero aquela altura. Certamente os dois primeiros álbuns do Massacra fizeram com que eles ganhassem esse título, porque depois do terceiro álbum, foi só ladeira abaixo, onde a banda passou descaracterizar profundamente ao seu estilo inicial e começaram a aderir as modinhas dos anos 1990, o que apodreceu vertiginosamente a carreira da banda. Seu terceiro e último álbum Death/Thrash foi o “Signs of the Decline” 1992 (Vertigo Records) e muito provavelmente o álbum mais inclinado ao Death Metal que a banda lançou, claro que levando em consideração o que tudo levava a crer naquela época que o Death Metal assim como outros estilos já tinha muito bem desenhado suas características essenciais e o Death Metal era um desses estilos.

Como já dito, após “Signs of the Decline” foi o último suspiro do Massacra como uma banda de Death/Thrash, a banda ainda lançou dois discos após seu terceiro álbum, mas era mais uma banda de Thrash Metal fracassada que estava incorporando o groove em seu som e seguindo a tendencia da época. A banda se separou depois que o guitarrista Fred Duval morreu de câncer de pele em 6 de junho de 1997, aos 29 anos. Alguns membros da banda formaram um projeto paralelo industrial chamado Zero Tolerance em 1996 e lançaram um álbum pela Active Records.

Ainda em território francês, nasceu Agressor, porém não como Agressor e sim como Kataclism ainda no ano de 1985. Somente em 1986 a banda passou a se chamar Agressor e usar algumas canções que foram compostas para o Kataclism. O primeiro registro da banda foi a demo “The Merciless Onlslaught” de 1986 contendo 3 sons em aproximadamente oito minutos. Alex, guitarrista e vocal foi o fundador da banda e para esta demo contou com Momo no baixo e Destroy na bateria. A banda ainda lançaria outras demos, principalmente ensaios ao longo de dois anos, quando conseguiu lançar um split muito emblemático ao lado de outra banda francesa de Death/Thrash chamada Loudbalst, o split foi lançado em 1988 chamado “Licensed to Thrash” através do selo também francês New Wave.

Certamente o lançamento desse split serviu muito para que o Agressor fosse apresentado ao grande público e pudesse chamar a atenção de gravadoras que estavam em busca de novos artistas para seu cast. Mas o trio Agressor foi abalado por duas baixas, restando apenas seu membro fundador que teve que buscar por novos músicos e isso acontece para quem em 1989 eles lancem uma demo que vai chamar a atenção devida, seu trabalho árduo no underground rendeu ao Agressor um contrato com a Major Noise Records da Alemanha, colocando a banda com a primeira da cena francesa a assinar com um selo internacional.

Agressor tinha um som extremamente pesado e, assim como o Massacra, era possível perceber muita coisa da sonoridade das bandas brasileiras no som deles e vice-versa. Seria muito fácil detectar a sonoridade tanto do Massacra quando do Agressor nessas características de bandas brasileiras, ainda que essa conexão fosse muito distante, física e ideologicamente falando, os sons se assemelhavam muito, no caso do Agressor, especificamente no primeiro álbum lançado pela Noise Records em 1990, “Neverending Destiny”! o cartão de visitas desse álbum é, realmente, a brutalidade com que eles aliaram o Thrash Metal e uma oficina metálica de terror. É muito grotesco o som que eles expressam nesse álbum e não dá para dizer que ali estava a essência do Death/Thrash Metal, ainda que com toda rispidez que as gravações ainda possuíam fora do eixo das bandas da Florida ou que gravaram com Scott Burns.

Agressor, nome extraído de uma música do Hellhammer, foi uma banda que primou pelo primitivismo, velocidade e agressividade em sua música fazendo jus ao seu nome e ultrapassou alguns limites vistos em bandas que ainda não haviam definido muito bem seu estilo. Agressor transitou muito bem entre os dois mundos, o mundo do Thrash Metal e o mundo do Death Metal, isso foi essencial para que pudéssemos perceber que em pequenos fragmentos, a sonoridade de ambos os estilos estava bem definidas na criatividade da banda, ainda que existissem ouvidos maus treinados para escutar tamanha abominação sonora.

No seu segundo álbum, Agressor apresenta nova formação mais uma vez e agora com um tecladista, um fator muito inusitado para as bandas de Death Metal, exceto Nocturnus … “Towards Beyond” 1992 (Black Mark Records) é um disco muito diferente do primeiro álbum, é um disco mais experimental, cheio de novidades sonoras que exploram o orientalismo por exemplo e flerta fortemente com o que ficou conhecido como Avantgarde, quando não sabíamos exatamente o que falar sobre a sonoridade da banda, daí para frente Agressor se tornou uma banda que estava um pouco longe de ser aquilo que esperávamos deles no seu álbum seguinte e ficou em dívida.

A essa época a banda já havia assinado com a gravadora Black Mark e já teria contrato para lançar outros materiais e fazer seu estilo seguir por aqueles caminhos do Avantgarde, obviamente que as mudanças de formação devem ter interferido profundamente no som da banda e aqueles elementos do Thrash Metal ficaram mais próximos dos recursos, das ferramentas que ornariam os rumos sonoros que a banda escolheu para trilhar, pois os blastbeats estavam mais encorpados e a atmosfera mais soturna do som deles chegava a fazer lembrar de bandas que tinha atuações quase que Jazzisticas e fusion como Atheist. “Satans Sodomy” EP de 1993 e “Symposium of Rebirth” 1994 (Black Mark Records) seriam os últimos lançamentos da banda que parou suas atividades em 1996, porém retornou em 1999 com um novo álbum chamado “Medieval Rites” agora pela Season of Mist.

Agressor entre o primeiro e o segundo álbum são irreconhecíveis, mas também quero aqui declarar que, apesar dos sons serem distintos, “Towards Beyond” está longe de ser um disco ruim, muito pelo contrário, é um álbum excelente, de fortes ideias e inclusive eu acredito que Agressor foi uma dessas bandas injustiçadas pelo tempo, que não reconheceu com o passar dele, do tempo, a contribuição da banda para a formação de um nicho importante do Metal Extremo e até mesmo a influência que a banda poderia ter feito em bandas da cena na época.

Diante de tantas citações e da extensão deste artigo de hoje, irei reservar espaço para mais dizeres na parte 19, deixando aqui mais uma contribuição para o conhecimento iniciático de muitos, assim como o resgate da memoria de muitos outros e o registro destes pensamentos para que possamos tecer críticas e análises mais embasadas sobre estes estilos oriundos do Thrash Metal que, por sua vez, se originou de uma fusão talvez inusitada entre Metal e Hardcore. Pra completar fica aqui a tradicional lista de recomendações de hoje:

Necrodeath – “Into the Msacabre” 1987 (Nightmare Productions)
Necrodeath – “Fragments of Insanity”, 1989(Metalmaster Records)
Messiah – “Hymn to Abramelim” 1986 (Chainsaw Murder Records)
Messiah – “Extreme Cold Weather” 1987(Chainsaw Murder Records)
Massacra – “Final Holocaust” 1990 (Shark Records)
Massacra – “Enjoy the Violence” 1991 (Shark Records)
Massacra – “Signs of the Decline”1992 (Vertigo Records)
Agressor – “Neverending Destiny” 1990 (Noise Records)